Sudão do Sul realiza a primeira campanha de vacinação do mundo para controlar um surto de hepatite E

A hepatite E pode causar doenças graves e é especialmente fatal para mulheres grávidas; a vacinação contra surtos pode reduzir a incidência da doença e mortes.

Foto: Peter Caton/MSF
Foto: Peter Caton/MSF

Pela primeira vez no mundo, profissionais de saúde realizaram uma campanha de vacinação em resposta a um surto de hepatite E. A ação aconteceu no Sudão do Sul, onde equipes realizaram uma campanha de imunização que aumentou as esperanças na luta contra uma doença que é especialmente fatal para mulheres grávidas.

A hepatite E é a causa mais comum de hepatite viral aguda, causando aproximadamente 20 milhões de infecções e 44 mil mortes por ano. É transmitida através da água e de alimentos contaminados por fezes. Surtos em grande escala geralmente ocorrem quando a água e o saneamento são inadequados, como em campos de deslocados em massa. Não há tratamento específico para a hepatite E, que apresenta uma taxa de mortalidade de até 25% entre as mulheres grávidas. A enfermidade também aumenta o risco de abortos espontâneos e natimortos.

A luta contra a hepatite E tem sido longa e frustrante“, disse Monica Rull, diretora médica de Médicos Sem Fronteiras (MSF). “Nas últimas duas décadas, a organização vem respondendo a surtos de hepatite E em campos de deslocados, tentando controlar a doença em condições desafiadoras e vendo o impacto devastador em comunidades extremamente vulneráveis. Com a experiência desta campanha de vacinação, esperamos mudar a maneira de combater a hepatite E no futuro.”

Nakia John, que vive no acampamento de deslocados internos de Bentiu, está sendo vacinada contra a hepatite E em resposta a um surto, a primeira vez no mundo. Unity State, Sudão do Sul, abril de 2022.

Foto: Peter Caton/MSF

Em março e abril de 2022, MSF e o Ministério da Saúde do Sudão do Sul realizaram conjuntamente as duas primeiras rodadas da campanha de vacinação contra hepatite E no campo de deslocados internos de Bentiu, no estado de Unity, no Sudão do Sul. Cerca de 25 mil pessoas, incluindo mulheres grávidas, receberam o imunizante. Uma terceira e última rodada será realizada em outubro de 2022.

“Dada a implementação bem-sucedida e a resposta entusiástica da comunidade nas duas primeiras rodadas, esta campanha de vacinação inovadora pode servir de exemplo e ser replicada em ambientes semelhantes, gerenciando surtos de hepatite E”, disse John Rumunu, diretor-geral dos Serviços de Saúde Preventiva do Ministério da Saúde. “Espero que a vacina ajude a reduzir infecções e mortes por hepatite E em Bentiu e além.”

Criado em 2014, no auge da guerra, Bentiu é o maior campo de deslocados do Sudão do Sul. Hoje, cerca de 112 mil pessoas residem lá, muitas delas fugiram da violência e das inundações recentes. MSF está presente no acampamento desde o início e tem visto surtos de hepatite E desde 2015. Os surtos são consequência das péssimas condições de vida no local, incluindo a falta de acesso à água, saneamento e higiene adequados.

Em 2021, inundações extremas e a chegada de mais pessoas deslocadas agravaram as péssimas condições de vida, aumentando a propagação de doenças transmitidas pela água, incluindo a hepatite E. Desde julho de 2021, em um hospital administrado por MSF em Bentiu, a organização atendeu 759 pacientes com hepatite E confirmada, 17 dos quais morreram.

O Ministério da Saúde do Sudão do Sul pediu a MSF que ajudasse nos esforços para controlar o surto, por meio de uma campanha de vacinação em larga escala. A única vacina disponível contra a hepatite E, a Hecolin, demonstrou em ensaios clínicos ser altamente eficaz na prevenção da doença. Desde 2015, a Organização Mundial da Saúde (OMS) recomendou que o imunizante seja considerado para uso em respostas a surtos. No entanto, até agora, só foi usado individualmente na China, onde é licenciado e utilizado para vacinar viajantes. A campanha de vacinação em Bentiu é a primeira que recorre ao imunizante em resposta a uma emergência de saúde pública.

Uma carta descrevendo a campanha de vacinação foi publicada no The Lancet Infectious Diseases.

“Este é um marco significativo nos esforços globais para combater a hepatite E”, disse Melanie Marti, médica do departamento de imunização, vacinas e produtos biológicos da OMS. “É a primeira vez que uma vacina é usada para combater os efeitos dessa doença potencialmente devastadora. Esse fato ocorre uma década após o licenciamento da vacina e sete anos após a política da OMS para usá-la em cenários de surtos. Na OMS, incentivamos fortemente a todos os países que experimentam um surto a usar a vacina contra a hepatite E, inclusive em mulheres grávidas.”

Elizabeth Nyaruon Thon é a líder comunitária do acampamento de deslocados internos de Bentiu. Ela está apreensiva com as terríveis condições de água e saneamento no acampamento que estão resultando em surtos de doenças, como a hepatite E. "A higiene e o saneamento aqui não é nada bom. Há moscas por toda parte porque os sanitários não são adequados. Precisamos muito de novos banheiros", disse Elizabeth. Sudão do Sul, abril de 2022.
Foto: Peter Caton/MSF

O sucesso da campanha de vacinação de Bentiu mostra que é possível usar a vacina em resposta a surtos, mesmo em condições difíceis. O Ministério da Saúde do Sudão do Sul e MSF estão monitorando e relatando os resultados da campanha de vacinação. Embora outras medidas de controle de surtos também sejam necessárias, incluindo a melhoria dos serviços de água e saneamento, as autoridades de saúde acreditam que esta campanha de vacinação é um passo importante para reduzir a carga da hepatite E no futuro. A organização espera que a campanha incentive outros países a usar o imunizante como parte das medidas de controle de surtos de hepatite E.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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