Séverine Bonnet/MSF

Campanha de Acesso

O que é a Campanha de Acesso a Medicamentos Essenciais?

Em seu trabalho de campo, equipes de MSF são constantemente frustradas pela falta de tecnologias adequadas para oferecer um tratamento de qualidade aos pacientes. Como resposta, a organização criou, em 1999, a Campanha de Acesso a Medicamentos Essenciais para melhorar o acesso às tecnologias existentes (medicamentos, métodos de diagnóstico e vacinas) e para estimular o desenvolvimento de novas e acessíveis ferramentas urgentemente necessárias nos países em desenvolvimento em que MSF trabalha. Em nosso trabalho, enfrentamos dois grandes desafios: o alto custo dos medicamentos existentes e a falta de tratamento para muitas das doenças que afetam nossos pacientes.

Foto: Julia Chade/MSF

1.

Prioridades e linha de atuação

  • Desnutrição
  • Tuberculose (TB)
  • Maior disponibilidade e preços acessíveis às opções de tratamento de HIV. Novos medicamentos são muito caros em função da falta de concorrência e são estudados de maneira insuficiente para o uso das populações que mais necessitam.
  • Acelerar a implementação da terapia combinada envolvendo artemisinina para malária.
  • Estimular estratégias de Pesquisa & Desenvolvimento (P&D) adequadas aos países onde MSF atua.

2.

Principais barreiras no acesso a medicamentos em países em desenvolvimento

  • Muitos medicamentos, em especial os relativamente novos como os coquetéis para o tratamento do vírus HIV, são muito caros. A proteção patentária contribui para os altos preços. Os laboratórios detêm o monopólio por até 20 anos, bloqueando a concorrência com versões genéricas mais baratas.
  • Quando novos tratamentos são desenvolvidos, pode levar um longo tempo até que eles se tornem realmente disponíveis aos pacientes.
  • Pesquisa e desenvolvimento (P&D) não são orientados pelas necessidades das populações dos países em desenvolvimento. Medicamentos e métodos de diagnóstico são desenvolvidos em função do seu potencial mercado consumidor e não pelas necessidades dos pacientes.
  • Uma vez que essas tecnologias se tornam disponíveis, outras barreiras ao acesso se tornam mais evidentes.

3.

Principais mudanças e melhoras no acesso a medicamentos nos últimos dez anos

  • A ampliação do acesso ao tratamento da infecção pelo HIV com antirretrovirais (ARV) se tornou uma realidade e uma prioridade internacional. Isso foi possível graças a uma grande redução dos preços dos medicamentos em função da concorrência com medicamentos genéricos. O custo do tratamento ARV de primeira linha passou de 10 mil dólares para menos de 100 dólares por paciente por ano. Além disso, também foi possível mostrar que o tratamento em países em desenvolvimento era possível. No entanto, os medicamentos mais novos, urgentemente necessários, continuam muito mais caros.
  • Um tratamento efetivo contra a malária, a terapia combinada envolvendo artemisinina (ACT, sigla em inglês), foi introduzido na maioria dos países africanos – ainda que haja um atraso em torná-la mais acessível.
  • Mais atenção para a urgência de se desenvolver novos tratamentos para as doenças mais negligenciadas, como doença do sono, leishmaniose e doença de Chagas. Medicamentos que estavam fora do mercado por não serem rentáveis, como a eflornitina – para combate à doença do sono –, voltaram a ser produzidos por pressão internacional.
  • Mais P&D com foco em doenças negligenciadas por pressão internacional. Algumas parcerias para o desenvolvimento de produtos (PDP) sem fins lucrativos foram criadas, sendo MSF uma das fundadoras da Iniciativa de Medicamentos para Doenças Negligenciadas (DNDi, na sigla em inglês). No entanto, o número de pesquisas e os recursos dessas parcerias ainda são insuficientes.
  • Maior reconhecimento do impacto negativo da proteção patentária para a saúde pública nos países em desenvolvimento. O uso das flexibilidades de proteção da saúde pública do TRIPS pelo Brasil, Tailândia e Índia aumentaram o acesso a alguns medicamentos. Isso não exclui o fato de que a maioria dos novos tratamentos estará patenteada nos países em desenvolvimento.
  • O reconhecimento internacional de que o atual sistema de P&D é falho para atender às necessidades das populações que mais precisam de inovações médicas. Governos têm negociado no âmbito da Organização Mundial da Saúde (OMS) formas de mudar as prioridades e o apoio ao P&D.

4.

A Campanha no Brasil

A Campanha de Acesso a Medicamentos Essenciais (CAME) está presente no Brasil desde 2001, quando facilitou uma doação de versões genéricas de antirretrovirais (ARV) produzidos no país a projetos de HIV/Aids de MSF na África do Sul. Tratava-se de um contexto no qual os preços desses medicamentos praticados pelas empresas farmacêuticas multinacionais eram exorbitantes. A partir de então, várias atividades estratégicas e de sensibilização foram desenvolvidas no Brasil, em articulação com grupos da sociedade civil, para as implicações da proteção patentária e de outras práticas monopolistas no acesso a medicamentos essenciais.

Atualmente, a CAME atua como membro do Grupo de Trabalho de Propriedade Intelectual (GTPI) dentro da Rede Brasileira Pela Integração dos Povos (REBRIP). O GTPI/Rebrip reúne entidades da sociedade civil que atuam para garantir o direito à saúde, entre elas entidades que trabalham com pessoas vivendo com HIV/Aids, com direitos humanos e com direitos do consumidor. O grupo, formado desde 2001, se dedica ao monitoramento e enfrentamento dos impactos das patentes no acesso a produtos essenciais e ao conhecimento, no que diz respeito aos medicamentos em especial.

Transparência importa

Os altos preços de medicamentos, vacinas e diagnósticos são frequentemente justificados pela indústria farmacêutica por alegações de que são gastos bilhões em pesquisa e desenvolvimento (P&D) para trazê-los ao mercado.

No entanto, é difícil fundamentar essas justificativas porque as empresas não divulgam quanto gastam em P&D.