Sarampo no Sudão do Sul: pessoas que fogem do conflito no Sudão enfrentam nova crise de saúde

Equipes de MSF estão sobrecarregadas e atendendo um número expressivo de pacientes; a maioria são crianças menores de 5 anos.

Nasir Ghafoor/MSF

As equipes de Médicos Sem Fronteiras (MSF) estão registrando um aumento preocupante nos casos de sarampo e desnutrição nas instalações da organização no Sudão do Sul, particularmente entre os repatriados que fogem de conflitos do Sudão e nas comunidades locais que estão acolhendo as famílias.

As instalações médicas de MSF nos estados do Alto Nilo, Unity, Bahr-El-Ghazal do Norte e Warrap estão recebendo pacientes que sofrem de sarampo e outras condições críticas, a maioria crianças com menos de 5 anos de idade. À medida que mais repatriados chegam a vários locais de fronteira, MSF pede aos atores humanitários que melhorem urgentemente o sistema de monitoramento e ampliem a resposta desde os pontos de entrada até os locais de reassentamento* , para garantir condições dignas para as pessoas deslocadas e as comunidades locais.

O sarampo e as respostas nutricionais devem ser reforçados imediatamente. A triagem e a vacinação de recuperação nos pontos de entrada devem ser estendidas para 24 horas por dia, 7 dias por semana”.
– Mohammad Ibrahim, coordenador-geral de MSF no Sudão do Sul.

“Do mesmo modo, as equipes móveis de vacinação devem ser colocadas em trânsito, nos locais de recepção e nas comunidades locais para garantir a triagem contínua e a vacinação de recuperação** para os recém-chegados que não foram atendidos na fronteira. A vigilância comunitária deve ser reforçada para evitar a propagação do sarampo”, diz Mohammad Ibrahim, coordenador-geral de MSF no Sudão do Sul.

Desde o início do conflito, mais de 200 mil pessoas atravessaram para o Sudão do Sul até a primeira semana de agosto. Mais de 90% delas são cidadãos sul-sudaneses, que chegam exaustos e extremamente vulneráveis.
Essas pessoas, principalmente mulheres e crianças, estão espalhadas por todo o país lutando para se integrar às comunidades ou em centros de trânsito perto da fronteira. Em ambos os casos, há a necessidade de serviços essenciais, como saúde, acesso à água potável e a infraestrutura de saneamento, alimentos e itens não alimentares, proteção e abrigo.

• Assista: Pessoas que fogem dos conflitos no Sudão necessitam de apoio no Sudão do Sul

Estamos em uma situação terrível. Não há comida. Vivemos debaixo das árvores. Queremos três coisas para sobreviver: alimento, lonas de plástico para fazer um abrigo e medicamentos”.
– Nyakiire Nen, mãe de uma paciente pediátrica de MSF no acampamento de deslocados internos de Bentiu.

Necessidades crescentes e resposta de MSF

Tendo em vista o fluxo alarmante de casos de sarampo em Renk e Bentiu, as equipes de MSF criaram alas de isolamento específicas, enquanto a capacidade das instalações de MSF é expandida para tratar mais pacientes em Aweil, Leer e Malakal.

No condado de Twic, MSF apoiou a instalação e o equipamento de um centro de isolamento de sarampo com 25 leitos no Hospital Mayen Abun e também auxiliou no treinamento de profissionais de saúde da linha de frente na definição de casos, identificação e manejo do sarampo em oito centros de atenção primária à saúde em todo o condado.

No estado do Alto Nilo, Renk é o ponto de entrada mais movimentado para o Sudão do Sul, por aqueles que escapam do conflito. Muitos deles vêm do estado do Nilo Branco, no Sudão, onde, no mês passado, as equipes de MSF identificaram mais de 1.300 casos suspeitos de sarampo. Desde junho, a ala de isolamento criada por MSF no hospital do condado de Renk recebeu 317 pacientes, sendo mais de 75% de retornados.

Para evitar que o sarampo tire mais vidas, há uma necessidade urgente de aumentar o apoio alimentar e realizar a vacinação”.
– Ran Jal kuol, médico de MSF.

Os jovens são os mais afetados, sendo que mais de 80% dos pacientes são crianças menores de 4 anos. Menos de 15% deles já foram vacinados contra o sarampo. Como esses repatriados vivem juntos em centros de trânsito congestionados e fazem a travessia em caminhões ou barcos lotados, a propagação da doença é enorme. No final de julho, MSF lançou uma intervenção de emergência de três semanas em Paloich, com o objetivo de atender às necessidades de saúde e nutrição de mais de 3 mil pessoas que residem no acampamento dos repatriados.

“Meus filhos eram saudáveis quando estávamos em Cartum (capital sudanesa). Mas no caminho, eles começaram a ter diarreia e ficaram fracos. Estávamos bebendo água do rio em Malakal, e a cor era quase vermelha. Quando estávamos a bordo do barco de Malakal para Bentiu, as crianças começaram a ter sintomas de sarampo”, Martha Nyariek fala de sua filha de 1 ano, Nyageng Mawich, e seu filho de 3 anos, Bol Mawich, que estão entre os centenas de pacientes que as equipes médicas de MSF têm tratado no estado de Unity.

Em Malakal, a situação humanitária dos repatriados no Centro de Trânsito de Bulukat continua a ser terrível e agravada pela falta de alimentos e pelos movimentos até seu destino final. Eles vêm em grande número com muitas pessoas doentes, principalmente crianças. Um aumento constante de casos de desnutrição está sendo registrado nas instalações de MSF. Iniciamos atividades com uma clínica móvel no centro de trânsito, enquanto o hospital de MSF – a única instalação de saúde de nível secundário para crianças – está trabalhando além de sua capacidade de leito. Da mesma forma, o hospital de MSF em Aweil testemunhou um aumento de 65% nos casos de desnutrição no primeiro semestre de 2023, em comparação com o mesmo período do ano passado.

Ran Jal kuol, médico de MSF, examina uma criança na ala de isolamento para sarampo de MSF no condado de Leer, no estado de Unity. © Nasir Ghafoor/MSF

“Se uma criança está com desnutrição, é mais fácil ser infectada pelo sarampo e há um risco maior de morte”, diz Ran Jal kuol, médico de MSF. “A maioria dos nossos pacientes são crianças não vacinadas. Para evitar que o sarampo tire mais vidas, há uma necessidade urgente de aumentar o apoio alimentar e realizar a vacinação de recuperação para imunizar a todos, especialmente os repatriados a partir dos seis meses de idade. As crianças entre seis meses e quatro anos são as mais vulneráveis”, completa.

O Sudão do Sul já está propenso a surtos regulares de sarampo. Em 2022, dois surtos de sarampo foram declarados pelas autoridades de saúde do Sudão do Sul, com o último afetando todos os estados e áreas administrativas. O afluxo de repatriados e o aumento de casos de sarampo entre a população deslocada e as comunidades locais é outro desafio para um sistema de saúde que já é insuficiente para atender às necessidades.

 

*Reassentamento é a transferência de refugiados de um país anfitrião para outro Estado que concordou em admiti-los e, em última instância, conceder-lhes assentamento permanente, de acordo com a definição da Agência da ONU para Refugiados (ACNUR).

**Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), a vacinação de recuperação refere-se à ação de vacinar um indivíduo que, por qualquer motivo, não recebeu uma ou mais doses de vacinas para as quais é elegível, de acordo com o calendário nacional de imunização.

 

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