Entidades da Sociedade Civil criticam omissão de órgão de defesa da concorrência ao não coibir abuso de preços em medicamento para hepatite C

Para MSF, CADE ignorou ameaça ao programa público de tratamento da doença.

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Após quase três anos de procedimento preparatório, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) decidiu arquivar uma denúncia contra a multinacional farmacêutica Gilead por abuso de preços e patentes relativos ao medicamento sofosbuvir, usado para a cura da hepatite C. A denúncia representou uma ação inédita no CADE, por ser a primeira sobre altos preços de medicamentos e também a primeira apresentada ao órgão por grupos de pacientes e consumidores.

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De acordo com Alan Silva, advogado que atuou no caso em nome da Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids (ABIA), “no campo da saúde, o CADE se mostrou impermeável a argumentos que mostram o impacto do abuso de poder econômico na vida das pessoas e falhou em agir mais incisivamente em prol da garantia de direitos fundamentais.”

“É lamentável que os preços extremamente altos que a Gilead tem cobrado por tratamentos de hepatite C no Brasil não sejam alvo de uma investigação mais profunda, apesar de terem constantemente colocado em risco o programa de acesso gratuito a medicamentos contra a doença, do qual dependem milhares de pessoas”.
– Felipe de Carvalho, assessor da Campanha de Acesso de Médicos Sem Fronteiras (MSF).

Entre 2015 e 2018, o Ministério da Saúde teve que oferecer os tratamentos mais eficazes de hepatite C de forma racionada, ou seja, tratar apenas os casos mais graves, devido aos altos preços, em especial do medicamento sofosbuvir, inicialmente ofertado por mais de R$ 25.000,00 por tratamento. Entre 2015 e 2017, mais de 6 mil pessoas morreram de hepatite C no Brasil e em 2018 havia 15 mil pessoas na fila de espera por tratamento.

Com a perspectiva da oferta de versões genéricas do sofosbuvir em 2018, o Ministério da Saúde finalmente adotou uma política de tratamento universal. Naquele ano, houve um breve momento de concorrência, quedas de preço e ampliação do acesso, mas desde então a Gilead tem utilizado suas patentes para bloquear competidores. Desde 2019 tem sido a única vencedora de todos os pregões do Ministério da Saúde. Em 2020, a empresa aumentou os preços cobrados no Brasil, desrespeitando o teto definido no pregão daquele ano.

“Os preços de tratamentos baseados em sofosbuvir ainda são extremamente altos no Brasil. A combinação sofosbuvir/velpatasvir, a mais usada no país, custa R$ 7.100,00 por tratamento enquanto em outros países onde versões genéricas de um tratamento equivalente (sofosbuvir/daclatasvir) estão disponíveis, o preço é de R$ 670,00”, afirma Matheus Falcão, do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC), uma das organizações que atou junto ao CADE demandando a suspensão da patente concedida à Gilead.

Em sua decisão, o CADE afirma que novos indícios de violação às normas concorrenciais poderão ser investigados, por isso as organizações responsáveis pela denúncia contra a Gilead continuarão monitorando as violações sistemáticas praticadas por esta e outras empresas farmacêuticas, quando o abuso do direito de patente resulta em prejuízos irreparáveis à saúde e à vida de milhares de pessoas.

Assinam esta nota as organizações que atuaram como Representantes no Procedimento Preparatório nº 08700.005149/2019-18:

Defensoria Pública da União (DPU),
Médicos Sem Fronteiras – Brasil (MSF),
Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids (ABIA),
Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC)
Grupo de Incentivo à Vida (GIV),
Fórum das ONGs Aids do Estado de São Paulo (FOAESP),
Fórum de ONGs Aids do Rio Grande do Sul (FOARS),
Grupo de Apoio à Prevenção da Aids (GAPA/BA),
Grupo Solidariedade É Vida (GSOLEVIDA),
Universidades Aliadas para o Acesso a Medicamentos Essenciais (UAEM)

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