Cresce número de refugiados do Sudão que fogem para o Chade após acirramento dos conflitos

Confrontos se intensificaram em El Geneina, no Sudão, forçando 7 mil pessoas a cruzar a fronteira em apenas três dias.

Paciente atendido no hospital de Adré durante o novo fluxo de pessoas refugiadas que chegaram do Sudão. © Jan Bohm/MSF

Após o aumento dos conflitos em El Geneina, no estado de Darfur Ocidental, Sudão, as equipes de Médicos Sem Fronteiras (MSF) que trabalham do outro lado da fronteira, no leste do Chade, observaram um aumento imediato e considerável no número de pessoas que chegam à região.

No primeiro fim de semana de novembro, 36 pacientes feridos foram recebidos pelas equipes de MSF no Chade. As pessoas refugiadas vindas do Sudão são, principalmente, mulheres e crianças. Elas contam histórias de violência em grande escala contra civis.

“Nos primeiros três dias de novembro, vimos mais pessoas refugiadas recém-chegadas do que durante todo o mês anterior: cerca de 7 mil pessoas cruzaram a fronteira nesses dias”, explica Stephanie Hoffmann, coordenadora de atividades externas de MSF em Adré, uma cidade chadiana na fronteira com o Sudão.

“Vimos mães e crianças que precisaram deixar o Sudão sem nada, pois suas casas foram destruídas.”

As equipes de MSF prestam serviços médicos aos refugiados recém-chegados, em um posto da fronteira de Adré, vacinando crianças contra o sarampo, examinando-as para a desnutrição e encaminhando os pacientes que precisam de cuidados de saúde especializados urgentes diretamente para o hospital de Adré, onde equipes de MSF atuam com profissionais do Ministério da Saúde do Chade.

• Assista: refugiados na fronteira do Sudão com o Chade vivem emergência humanitária

A algumas centenas de metros da travessia da fronteira, refugiados esperam por pessoas recém-chegadas do Sudão, na esperança de receber notícias de suas famílias. Muitas vezes, é ali que eles tomam conhecimento sobre a perda de entes queridos no Sudão.

Atualmente, as equipes de MSF também oferecem apoio de saúde mental a pessoas em situação de estresse na fronteira e instalaram um tanque de água para fornecer água potável após a árdua jornada.

“A casa da minha irmã foi bombardeada à noite”, relata Amne, de 33 anos de idade, que cruzou a fronteira com seus quatro filhos. “A casa ficava ao lado da nossa. Nossa casa pegou fogo devido à explosão, e saímos imediatamente. Não sei o que aconteceu com minha irmã, se ela sobreviveu ou não”. Amne aponta para seu vestido, dizendo que a roupa que veste é o único bem que conseguiu levar consigo.

Refugiados são expostos à violência no caminho até o Chade

No hospital de MSF em Adré, nossas equipes atenderam um homem de 27 anos de idade que fugiu de El Geneina com outras 16 pessoas. O grupo foi atacado na estrada em direção ao Chade. Ele relatou que todas as pessoas que o acompanhavam foram mortas no ataque, mas ele conseguiu sobreviver fingindo estar morto. Em certo momento, um novo grupo de refugiados chegou e o ajudou a alcançar a fronteira. Ele tem vários ferimentos à bala nas mãos e pernas.

“El Geneina enfrentou uma escalada de violência terrível em junho deste ano, o que forçou a fuga de grande parte dos habitantes da cidade para o Chade, apesar dos muitos perigos e ataques que os aguardavam na estrada. A cidade passou então por uma relativa estabilidade e até recebeu pessoas deslocadas de outros locais”, diz Alkassoum Abdourahamane, coordenador do projeto de MSF em El Geneina. “Agora, as explosões e o medo tomaram conta mais uma vez.”

Primeiro paciente recebido pela equipe de MSF no Chade, quando o fluxo de refugiados do Sudão aumentou, após a intensificação dos conflitos em El Geneina. © Jan Bohm/MSF

No domingo, MSF doou equipamentos médicos para a unidade de emergência do Hospital Universitário de El Geneina. Esses suprimentos já ajudaram no tratamento de 120 pacientes. A equipe também fez doações para três unidades de saúde na estrada entre El Geneina e Adré, fornecendo kits para tratar malária, diarreia e infecções respiratórias em adultos e crianças.

As histórias das últimas chegadas fazem eco com as relatadas pelo grande número de refugiados que chegaram em Adré em junho, quando a população da pequena cidade triplicou.

Naquela ocasião, de 15 a 17 de junho, o hospital recebeu mais de 850 feridos de guerra, um dos maiores números que nossas equipes já atenderam. Muitos pacientes que sofreram ferimentos de bala, particularmente no abdômen, costas e pernas, relataram violência angustiante em El Geneina e ataques na estrada para o Chade, com homens armados que atiraram em pessoas que fugiam. Enquanto isso, nossas equipes em El Fasher, capital do estado de Darfur do Norte, têm testemunhado um número significativo de pessoas deixando a cidade com medo da crescente violência.

Resposta atual não é capaz de cobrir todas as necessidades

Desde que a guerra no Sudão começou, em abril de 2023, há mais de seis meses, milhões de pessoas foram forçadas a fugir, deixando para trás suas casas e meios de subsistência. A maioria ainda está no Sudão, mas estima-se que 1,1 milhão de pessoas cruzaram a fronteira para países vizinhos. A maior parte está agora no Chade, um país que já enfrenta múltiplas crises humanitárias.

“Apesar dos esforços coletivos das comunidades locais, autoridades e organizações humanitárias, a resposta humanitária ainda não corresponde à magnitude da crise no leste do Chade, o que também está pressionando as comunidades em situação de vulnerabilidade”, explica Claire Nicolet, coordenadora da resposta de emergência de MSF no Chade e no Sudão.

Paciente recebido pela equipe de MSF no Chade, quando o fluxo de refugiados do Sudão aumentou, após a intensificação dos conflitos em El Geneina. © Jan Bohm/MSF

“Muitas pessoas estão vivendo em acampamentos improvisados, onde as condições permanecem terríveis. Enquanto isso, o último aumento na chegada de refugiados é outra indicação de que as necessidades continuam a crescer e que o conflito está longe de terminar”, lamenta Nicolet.

“Continuamos a apelar para uma ampliação imediata da ajuda humanitária para fornecer assistência às pessoas em situação de maior vulnerabilidade, tanto refugiados como chadianos, e para garantir o acesso a serviços básicos, como água, cuidados de saúde, abrigo e alimentos.”

As equipes de MSF estão fornecendo cuidados médicos essenciais nos acampamentos de Adré, Ourang e Metche, na província de Ouaddai, assim como nos acampamentos de Goz Achiye, Daguessa e Anderessa, localizados na região fronteiriça da província de Sila.

Desde o início da resposta de emergência no leste do Chade, MSF forneceu mais de 96 mil consultas, hospitalizou 8.492 pacientes, tratou 7.155 pessoas com desnutrição e 31.955 com malária, realizou 1.634 cirurgias e auxiliou em 1.043 partos. Nossas equipes também estão distribuindo itens de primeira necessidade e fornecendo até 80% da água potável disponível para os refugiados.

 

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