Conheça Jacir de Souza, liderança indígena parte da história de MSF

MSF atuou contra o novo coronavírus em Boa Vista, onde Jacir se recuperou da COVID-19

Conheça Jacir de Souza, indígena da etnia Macuxi e parte da história de MSF em Roraima

MSF atuou no combate à pandemia de COVID-19 na UTI do Hospital de Campanha de Boa Vista, capital de Roraima. Na unidade de saúde, nossas equipes reencontraram Jacir de Souza, liderança indígena da etnia Macuxi, que chegou a ficar internado, mas se recuperou do novo coronavírus. Jacir conhece bem MSF desde o princípio dos anos 90, quando apoiou uma de nossas primeiras atividades no país, contra uma epidemia de malária em comunidades indígenas em seu estado. No artigo abaixo, Vitória Ramos, especialista em assuntos humanitários de MSF no Brasil, conta um pouco mais sobre essa história:

“Nós o conhecemos desde a década de 1990, quando ele teve um papel fundamental na redução da incidência da malária entre as comunidades indígenas de Roraima. Jacir de Souza, um ativista incansável pelos direitos de seu povo, sobreviveu ao novo coronavírus, diferentemente de muitos amigos e pessoas de sua família.

As crescentes e negligenciadas necessidades de saúde das populações mais vulneráveis no Brasil, assim como sua evidente vulnerabilidade em frente à ameaça de COVID-19, fizeram com que iniciássemos em 2020 a maior operação já realizada por nossa organização no país.

No entanto, nossa primeira experiência de campo no Brasil remonta ao início dos anos 1990, quando enviamos várias equipes para a região amazônica para lutar contra epidemias que estavam devastando a população indígena.

Em uma dessas iniciativas, atuamos para responder a uma epidemia de malária no estado de Roraima, no extremo norte do país; uma operação que desde o início foi realizada em colaboração com as comunidades indígenas locais.  

Nós carregamos dezenas de microscópios para o diagnóstico de malária em laboratórios e treinamos centenas de pessoas das comunidades no uso dos mesmos, além de capacitá-las para atuar em equipes de saúde.

O resultado mais imediato foi uma queda significativa no número de casos e uma diminuição no número de mortes. E o resultado de longo prazo continua a ser visto hoje, por meio do trabalho de entidades locais que continuaram o que começamos e que, quando saímos no final dos anos 1990, seguiram fazendo uso proveitoso dos equipamentos que deixamos para eles. E ainda mais importante: continuaram contando com os profissionais que adquiriram a formação necessária para o desempenho de suas tarefas.

Até então, uma das lideranças indígenas que nos ajudou a realizar nosso trabalho foi Jacir de Souza, uma figura em destaque entre os membros da etnia Macuxi. Ele foi diretor do Conselho Indígena de Roraima e, até hoje, continua sendo reconhecido por ter desempenhado um papel muito ativo nas mobilizações que serviram para demarcar as terras onde hoje está localizada a Reserva Indígena Raposa Serra do Sol.

Mais de 20 anos após a conclusão bem-sucedida de nosso projeto na região, os caminhos de ambos se cruzaram novamente; desta vez com Jacir, hoje com 72 anos de idade, como um de nossos pacientes.

No começo, quando ele teve os primeiros sintomas de COVID-19, Jacir admite que relutou em buscar ajuda na capital Boa Vista. Muitas pessoas morriam em hospitais e isso lhe causava grande desconfiança. No entanto, sua condição não estava evoluindo bem e ele finalmente resolveu viajar para a cidade em busca de atendimento médico.

Ele foi internado em um hospital de campanha construído especialmente pelas autoridades locais para aliviar o fardo que a COVID-19 estava causando ao já precário sistema de saúde de Roraima. E para sua surpresa, ele descobriu que vários dos médicos e enfermeiras de terapia intensiva eram profissionais de Médicos Sem Fronteiras. Eles vieram para compartilhar toda a sua experiência de campo em outras epidemias, preencher a falta de pessoal médico e ajudar este centro a ser capaz de absorver de forma correta e eficaz o grande número de pacientes que chegou a suas instalações.

Jacir teve que ficar alguns dias na UTI, mas felizmente conseguiu se recuperar. E hoje está de volta em casa, onde está tão ativo como sempre. Infelizmente, um irmão mais novo, uma tia e sua sogra não tiveram o mesmo destino que ele; todos perderam a batalha contra esse vírus que só no Brasil tirou a vida de mais de 150 mil pessoas.  

Nosso projeto em Roraima foi concluído há algumas semanas, assim como o que iniciamos posteriormente no estado de Mato Grosso do Sul, onde nossas equipes voltaram a trabalhar para combater a COVID-19 em comunidades indígenas.

Em ambos os casos, como fazíamos há mais de 20 anos, nosso trabalho sempre foi realizado com a participação ativa dos membros dessas comunidades, pois em MSF estamos convencidos de que esta é a melhor maneira de fazer isso. E é o que Jacir já falava há 25 anos: “Para trabalhar com os indígenas, tem que atuar dentro da comunidade.” Algo que, por outro lado, seria aplicável a praticamente todos os contextos em que desenvolvemos a nossa atividade.”

 

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