Clínica de saúde materna afetada por terremoto é reconstruída por MSF no Haiti

Organização ampliou capacidade da estrutura médica na cidade de Port-à-Piment.

Quase dois anos se passaram desde que um terremoto de magnitude 7,2 atingiu o departamento de Sud, no Haiti, em 14 de agosto de 2021, matando mais de 2 mil pessoas e ferindo 12 mil. Muitas comunidades ainda estão se recuperando da destruição. O desastre destruiu dezenas de milhares de edifícios e muitas instalações médicas, incluindo a clínica de saúde materna apoiada por Médicos Sem Fronteiras (MSF) na cidade de Port-à-Piment. O edifício foi danificado além do que era possível reparar, então MSF o reconstruiu, atualizando as instalações.

O hospital melhorado foi inaugurado oficialmente em fevereiro de 2023, restabelecendo o acesso a cuidados de saúde materna para 250 mil pessoas na comunidade. No entanto, muitas outras instalações médicas no departamento Sud nunca foram devidamente reparadas, então o acesso aos cuidados de saúde permanece limitado para mulheres grávidas e recém-nascidos.

Bebês gêmeos nascidos na clínica de Port-à-Piment. Foto: Alexandre Marcou/MSF

Ainda que a violência que assola a capital do Haiti, Porto Príncipe, esteja longe da tranquila cidade litorânea de Port-à-Piment – cerca de 150 quilômetros a oeste – o efeito cascata já é sentido. Interrupções na cadeia de suprimentos levaram à escassez frequente de suprimentos médicos em hospitais e clínicas da cidade, e o bloqueio do principal terminal de combustível no porto da capital do país em 2022 causou escassez de combustível também no departamento de Sud.

Além disso, muitas equipes médicas de departamentos rurais, incluindo Sud, foram para Porto Príncipe. E muitas equipes médicas de Porto Príncipe deixaram o país para escapar da violência.

O terremoto de 2021 agravou ainda mais a situação. Várias organizações prometeram apoio financeiro e material para reabilitar estruturas médicas danificadas, mas esses esforços demoraram a se materializar, e poucas das estruturas danificadas no departamento de Sud foram reparadas até o momento

Por tudo isso, o sistema de saúde na região de Sud ficou em uma situação extremamente precária, com falta de suprimentos médicos, profissionais e instalações. A situação afeta gravemente a saúde da comunidade, particularmente mulheres grávidas e recém-nascidos.

Alta mortalidade materna

O Haiti tem a maior taxa de mortalidade materna no Hemisfério Ocidental, com 529 mortes a cada 100 mil nascimentos. A mortalidade neonatal também é muito alta, com 24 mortes a cada mil nascimentos. Aproximadamente 64% das mulheres não dão à luz em instalações de saúde, o que pode ter consequências fatais tanto para a mãe quanto para o bebê se surgirem complicações.

“É fundamental que os partos ocorram com o apoio dos profissionais de saúde. Uma resposta rápida pode salvar a vida da mãe e do bebê”.

– Benoit Vasseur, coordenador-geral de MSF no Haiti.

A instalação, que o Ministério da Saúde e MSF administram juntos, agora tem uma sala para cirurgia obstétrica, incluindo cesarianas, e um departamento neonatal equipado com uma unidade de terapia intensiva.

A equipe também oferece serviços de saúde sexual e reprodutiva abrangentes, incluindo cuidados contraceptivos, consultas pré-natais e pós-natais, e apoia seis centros de saúde em cidades e vilarejos ao redor de Port-à-Piment. Ao colaborar com as redes de partos tradicionais e voluntários na comunidade, a equipe de MSF tenta superar o primeiro obstáculo para alcançar melhores resultados de saúde materna: melhorar o conhecimento sobre quando as mulheres grávidas devem procurar ajuda médica.

Promoção de saúde

Pouco mais de 10 quilômetros ao norte de Port-à-Piment, ao longo de um leito seco de rio através das montanhas, fica o vilarejo de Rendel, que é visitado pela equipe médica de MSF e promotores de saúde uma vez por semana.

Profissionais de MSF visitam o vilarejo de Rendel uma vez por semana. Foto: Alexandre Marcou/MSF

Profissionais de MSF visitam o vilarejo de Rendel uma vez por semana. Foto: Alexandre Marcou/MSF

“Rendel é um dos seis lugares que apoiamos com orientações e promoção da saúde”, explica Guerline Georges, que trabalha com MSF em atividades de promoção de saúde. “Conversamos com mulheres grávidas sobre as principais causas de morte relacionadas ao parto, como eclâmpsia e transtorno hipertensivo, e sobre como detectar os sintomas para antecipar complicações e procurar tratamento rapidamente”.

Difícil acesso às unidades de saúde

As mulheres que vivem no vilarejo de Rendel também enfrentam outro obstáculo: chegar a uma unidade de saúde quando precisam de cuidados médicos. O departamento Sud é pouco povoado, o que significa que as instalações de saúde podem estar longe para algumas mulheres. Muitas vezes, as estradas estão em más condições e o transporte é caro.

Em Rendel, o leito seco do rio, que é usado como uma estrada, enche de água durante a estação chuvosa. Para as mulheres que vivem em vilarejos nas montanhas, no interior da costa, pode levar seis ou até sete horas para chegar a um centro de saúde a pé.

Infelizmente, mulheres em trabalho de parto já morreram enquanto caminhavam para um centro de saúde, sucumbindo às complicações do parto antes de chegar ao centro médico.

Para abordar essas questões, as equipes de MSF estão instalando comitês de referência em diferentes vilarejos, com o objetivo de facilitar o transporte de mulheres em trabalho de parto. MSF também administra um serviço de ambulância – veículos com tração nas quatro rodas adaptados para transporte médico.

“Quatro anos atrás, quando eu estava grávida do meu primeiro filho, os médicos me disseram que eu deveria ir ao hospital se sentisse alguma dor”, conta Alexis Leone, que vive em Rendel. “Não me senti bem, então caminhei até Port-à-Piment para uma consulta. Minha pressão arterial estava muito alta e fui transferida em uma ambulância para um hospital a uma hora de distância, onde dei à luz.”

“Eles [os médicos] me disseram que eu provavelmente teria morrido se tivesse ficado em Rendel.”

– Alexis Leone, paciente atendida por MSF.

O encaminhamento da estrutura anterior de MSF em Port-à-Piment para outro hospital salvou a vida de Alexis. Mas MSF percebeu que a organização dessas transferências se tornou cada vez mais difícil, já que as instalações de saúde para as quais os pacientes estavam sendo encaminhados estavam lutando para fornecer serviços essenciais, devido à falta de suprimentos, funcionários e outros problemas.

Essa é uma das razões pelas quais MSF melhorou a instalação em Port-à-Piment. Pacientes que haviam sido encaminhados anteriormente para outras instalações para cuidados de nível mais complexo agora podem ser tratados diretamente nessa instalação, que atualmente oferece cesarianas e transfusões de sangue, por exemplo. Isso representa uma grande melhoria para as pessoas que vivem dentro e ao redor de Port-à-Piment.

Elevado número de atendimentos

O elevado número de pacientes que a instalação tratou demonstra as enormes necessidades das mulheres no departamento Sud. Em 2022, as equipes de MSF assistiram a 700 partos em Port-à-Piment. De janeiro a abril de 2023, o novo hospital já apoiou 347 partos, 39 dos quais foram cesarianas. No mesmo período, 89 bebês foram admitidos no hospital, 40 deles na unidade de terapia intensiva.

No entanto, em outras cidades e vilarejos do departamento Sud, como Coteaux e Roche-à-Bateau, as instalações de saúde que foram destruídas não foram reconstruídas. Em Coteaux, os profissionais de saúde estão tentando trabalhar em um centro de treinamento, porque o centro de saúde ainda está em ruínas.

Para reduzir as altas taxas de mortalidade materna e neonatal, ainda precisa ser feito muito mais. Toda mulher grávida deve ser capaz de realizar seu parto com um profissional de saúde treinado em uma estrutura adequada com os suprimentos necessários.

Outras organizações precisam intensificar sua assistência, começando por cumprir as promessas que fizeram após o terremoto de 2021. Também precisam aumentar o apoio para financiar salários de profissionais de saúde adicionais em áreas remotas. É a única maneira de melhorar as chances de sobrevivência das mulheres grávidas nessa área do Haiti.

 

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