“Dia e noite, ainda ouço os gritos das pessoas”; leia os relatos de quem sobreviveu à travessia do Mediterrâneo

Há um mês, um naufrágio na Grécia deixou cerca de 500 pessoas mortas ou desaparecidas – foi o mais mortal no Mediterrâneo desde 2015.

No dia 14 de junho, há um mês, uma embarcação que levava centenas de refugiados afundou na costa da Grécia. Cerca de 500 pessoas morreram ou estão desaparecidas.

O naufrágio na Grécia, o mais mortal no Mar Mediterrâneo desde 2015, foi uma tragédia anunciada: essa é rota de migração marítima mais perigosa do mundo. E estes relatos são de quem sobreviveu a essa travessia entre os anos de 2021 e 2023.

Dia e noite, ainda ouço os gritos das pessoas e o som das suas gargantas a borbulhar com a água do mar e a sufocar enquanto se afogavam.”
– Sobrevivente do naufrágio do dia 14 de junho, na Grécia.

Registro do dia 3 de julho, no Mar Mediterrâneo. Michela Rizzotti/MSF

“Não bebi água por dois dias, mas chorei tanto que não senti sede. Quando o barco virou, me agarrei a uma grade de metal para salvar a minha vida. Eu podia ver as pessoas sendo jogadas ao redor, sendo esmagadas contra as partes do barco e sendo jogadas no mar.”

Leia mais: Histórias de mulheres que sobreviveram à travessia no Mediterrâneo

Eu desejava morrer no mar e não voltar para a Líbia.”
– Sobrevivente da Eritreia resgatado por MSF em janeiro de 2023.

 

“Nos obrigaram a carregar o barco inflável e colocá-lo no mar. Saltamos para dentro do barco. As ondas nos levavam para cima e para baixo. Apesar disso, não tínhamos medo. Mas quando um homem gritou que era a guarda costeira líbia, todos entraram em pânico e vomitaram. Eu desejava morrer no mar e não voltar para a Líbia.”

Ninguém ouvia nossas vozes, exceto os peixes. Mas os peixes não podiam nos salvar.”
– Abbas, sobrevivente resgatado por MSF em setembro de 2022.

Abbas, após ser resgatado pelo navio de MSF. Foto: Sonsoles Galindo/MSF

“Nos perdemos no meio do mar. Encontramos um barco e fomos em direção a ele. No caminho, paramos porque temíamos que fosse um navio de carga ou um navio líbio. Preferíamos morrer a voltar para a Líbia e ser aprisionados novamente.

A situação era perigosa e podia levar à morte. O ar estava acabando no barco de borracha. As ondas estavam grandes e estávamos perdidos.

Ninguém ouvia nossas vozes, exceto os peixes. Mas os peixes não podiam nos ajudar. Só queríamos continuar vivos, não chegar ao nosso destino. Esquecemos do nosso objetivo, que era chegar à Europa. Todo mundo estava pensando em como voltar à vida.

Escuridão no ar, escuridão na mente, escuridão no universo. O que fazer? Qual é o fim? A luz da esperança saiu da escuridão do céu, das profundezas do mar, da escuridão do universo. Acenamos e acendemos as tochas para que o navio de resgate pudesse ver um pequeno ponto de luz e seguir em nossa direção.
Ele nos salvou da morte. O navio da vida.”

Eu tinha certeza de que morreria.”
– Sobrevivente síria resgatada por MSF em maio de 2022.

Em 11 de maio de 2022, 67 pessoas foram resgatadas de uma embarcação de madeira no Mediterrâneo. Foto: Anna Pantelia/MSF

“Quando os socorristas chegaram, eu estava quase inconsciente. Eu não conseguia entender o que estava acontecendo. Naquele momento, já estávamos pelo menos há 48 horas no mar. Eu tinha certeza de que morreria.”

Leia sobre esse resgate: Em 72 horas, MSF resgata 470 pessoas em botes à deriva no Mediterrâneo

Foi um desastre, vimos coisas inacreditáveis, tão insuportáveis até para contar.”
-Romeo, sobrevivente resgatado por MSF em agosto de 2021.

 

“Tentei atravessar quatro vezes. Na terceira vez, partimos para o Mar Mediterrâneo. Foi um desastre, vimos coisas inacreditáveis, tão insuportáveis até para contar. É preciso coragem para contar uma história, porque nem tínhamos certeza de que conseguiríamos contá-la um dia. Ela me faz chorar, derruba as pessoas, toca o coração.”

No dia 3 de julho, a equipe do Geo Barents, navio de MSF, resgatou 196 sobreviventes no Mediterrâneo. Michela Rizzotti/MSF

Médicos Sem Fronteiras faz um apelo à responsabilização pelas vidas perdidas no Mar Mediterrâneo e à criação de um mecanismo de busca e salvamento no mar dedicado, proativo e liderado pelo Estado.

 

MSF está envolvida em atividades de busca e resgate no Mediterrâneo Central desde 2015. Desde então, resgatamos cerca de 90 mil pessoas de barcos em perigo.

 

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