9 perguntas e respostas sobre as vacinas da COVID-19

A MSF responde a algumas das questões-chave sobre as vacinas da COVID-19.

COVID-19

Qual é a melhor? Podem considerar-se seguras? Vão funcionar com as novas variantes? O que se passa com o acesso, uma vez que não estão a chegar a metade do mundo? Respondemos a várias questões-chave, um ano após ter sido declarado o início da pandemia.
 

1. No contexto de fornecimentos limitados de vacinas qual é o objetivo da vacinação contra a COVID-19?

O objetivo das campanhas de vacinação de qualquer país – face ao momento atual de escassez de fornecimentos – será o de diminuir a mortalidade causada pela COVID-19 e proteger os serviços de saúde relacionados com a COVID-19. Mas a vacinação em si mesma num contexto de fornecimentos limitados (e, portanto, com uma baixa cobertura) não permitirá “voltar à normalidade”. Pessoas nas quais a vacina funciona bem estão protegidas contra a doença, mas não está excluído que se possam infectar com o vírus e transmiti-lo, mesmo que não adoeçam. Isto significa também que se devem manter as medidas de prevenção, como a distância física, a lavagem das mãos e o uso de equipamentos de proteção individual.
Devem vacinar-se primeiro os profissionais de saúde, devido ao elevado risco que têm de exposição e transmissão, e as pessoas de idade avançada e imunodeprimidas (com sistemas imunitários debilitados) suscetíveis de desenvolver doença grave e morrer.

 

2. Qual é a melhor vacina da COVID-19 desenvolvida?

Os diferentes tipos de vacinas são fabricados utilizando diferentes tecnologias e ingredientes. A vacina ideal é aquela que é segura e eficaz. Outras caraterísticas desejáveis incluem o preço e a capacidade de aumentar a produção, a forma de administração (por exemplo, via oral ou injeção), o número de doses, a estabilidade térmica e a natureza e persistência das respostas imunitárias.
 

3. Tendo em conta a rapidez com que foram desenvolvidas as vacinas da COVID-19, podem considerar-se seguras?

A segurança das vacinas autorizadas é similar à de outras vacinas conhecidas e amplamente utilizadas. Tradicionalmente, o desenvolvimento de uma vacina pode levar até dez anos. Em caso de emergência, sempre que exista apoio financeiro suficiente (e, neste caso, houve-o indubitavelmente como se vê na resposta à pergunta seguinte), este processo pode acelerar-se. Neste caso, os resultados dos ensaios clínicos são avaliados de acordo com os mesmos padrões e não são suprimidos os passos importantes de segurança, mas o processo decorre de maneira mais rápida e eficiente. Por exemplo, realizando várias fases de ensaios clínicos ao mesmo tempo em vez de umas a seguir a outras; reduzindo o tempo de espera para completar a documentação; e enviando dados assim que estiverem disponíveis. Os avanços da biotecnologia estão a permitir o fabrico mais rápido para as fases de teste, mas ainda não para a grande escala.
A distribuição das vacinas está a ser já realizada em Portugal com rapidez, mas as doses não estão ainda a chegar aos contextos e aos países em que trabalhamos.

 

4. Se o funil está na produção, há alguma alternativa para aumentar o fabrico e reduzir as lacunas no acesso às vacinas?

Estamos a assistir a um cenário com enormes tensões e a negociações opacas. Até agora, o contexto é caracterizado pelo facto de que os países que pagam mais são os que têm mais população vacinada e as empresas farmacêuticas operam mediante acordos de compra bilaterais secretos. O acumular de vacinas pelos países ricos tem levado a uma maior desigualdade no acesso às vacinas. Um estudo da Universidade John Hopkins estima que um quinto da população não tenha acesso à vacina até pelo menos 2022. Um relatório do Instituto de Saúde Global da Universidade de Duke determinou que, por meados de janeiro passado, um grupo de países com elevados rendimentos e onde vive 16% da população mundal tinha já reservado 60% das provisões mundiais de vacinas.
E isto acontece com níveis sem precedentes de financiamento público recebido. É estimado que foram investidos mais de 8.200 milhões de euros na investigação e desenvolvimento, ensaios clínicos e fabrico das seis potenciais vacinas candidatas para a COVID-19.

A suspensão temporária das patentes até que seja alcançada a imunidade de grupo mundial, uma proposta apoiada por cem países na Organização Mundial do Comércio (OMC), permitiria a todos os países membros da OMC a possibilidade, se assim o escolhessem, de não conceder ou não fazer cumprir as patentes e outras medidas de propriedade intelectual sobre as tecnologias de saúde que sejam desenvolvidas para combater a pandemia. Em simultâneo, criaria um espaço de colaboração entre países para a investigação e desenvolvimento, para a produção e para o forneciimento dessas ferramentas para a COVID-19. Em suma, suspender temporariamente as patentes conduziria à entrada no processo de mais fabricantes e permitiria aumentar a produção.

Não seria a primeira vez que os membros da OMC adotariam uma exceção. Em 2001, em plena pandemia do VIH/sida, os Estados chegaram a um consenso para uma exceção relacionada com o parágrafo 6 da Declaração de Doha sobre os TRIPS (Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights, ou Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual relacionados com o Comércio) e a saúde púbica. Aquela exceção estabeleceu um mecanismo permitindo aos países que produziam medicamentos genéricos fornecer os fármacos a outros países que não tinham a capacidade de fabrico necessária para os produzirem eles mesmos.

Justamente nesse sentido, a MSF tem em marcha uma campanha em que apela a Portugal, a toda a União Europeia e aos demais Governos que se opõem àquela proposta na OMC, que não travem a suspensão de patentes enquanto dure a pandemia.
 

5. As vacinas vão funcionar contra as novas variantes ou estirpes?

Considera-se que o SARS-CoV-2 é um vírus bastante estável. Em comparação com a maioria dos vírus de ARN (ácido ribonucleico), incluindo o VIH, o SARS-CoV-2 muda muito mais lentamente à medida que se propaga. A maioria das mutações são pequenas. Muitas mutações não terão nenhumas consequências na capacidade do vírus para se propagar ou causar doenças.
Ainda assim, surgiram recentemente várias mutações que tiveram impacto na capacidade do vírus de se propagar e causar doença. Alguns estudos sugerem que algumas vacinas são menos eficazes contra a nova estirpe da África do Sul. Porém, até à data não existem evidências definitivas que sugiram que as vacinas sejam menos eficazes contra a atual estirpe dominante do vírus SARS-CoV-2, mas isso pode mudar no futuro. É necesssário controlar a epidemia no mundo todo, para diminuir o risco de que uma futura mutação escape ao efeito das vacinas existentes.

 

6. As vacinas previnem a doença, na sua forma grave, a hospitalização, morte e transmissão?

Vários ensaios clínicos mostraram que as vacinas aprovadas atualmente são muito eficazes para prevenir a COVID-19 em todas as suas formas sintomáticas, incluindo as graves e também em reduzir a mortalidade das pessoas a partir dos 16 anos. Do que ainda não há certezas é quanto tempo dura a proteção.
Após a aprovação, a agência reguladora e o Estado comprador têm a obrigação de continuar a fazer o acompanhamento médico das pessoas que participaram nos diversos ensaios clínicos; devem também investigar a segurança da vacina muito após a exposição. Isto permitirá igualmente a recolha de provas sobre a duração da proteção. Até ao momento, só estão disponíveis dados limitados sobre a proteção em crianças pequenas, em grávidas e em pessoas imunodeprimidas.

 

7. Por que é tão importante a temperatura das vacinas?

Além de garantir que existam vacinas suficientes, precisamos que as vacinas sejam as mais adequadas a determinados contextos e às populações-alvo. Assegurar o acesso equitativo a futuras vacinas da COVID-19 pode requerer um enorme desafio logístico, uma vez que algumas vacinas necessitam de condições muito exigentes da cadeia de frio. Por exemplo, a vacina da Moderna deve viajar a -20 ºC e a da Pfizer/BioNTech a -70 ºC, uma temperatura inferior à do inverno ártico.
É, portanto, um enorme desafio para o transporte, o armazenamento e o uso da vacina em todos os ambientes, especialmente naqueles de baixos recursos onde a Médicos Sem Fronteiras trabalha. Por isso, os requisitos de temperatura e de gestão da cadeia de frio constituem um desafio para garantir uma distribuição equitativa.

Os requesitos de uma cadeia de ultra-frio representam um desafio logístico e tornam a vacinação mais cara.
 

8. Quais são as diferentes formas em que um país pode obter ou comprar vacinas?

Para a maioria dos países de baixos ou médios rendimentos, existem diferentes mecanismos potenciais de entrega.

  • O Fundo de Acesso Global para Vacinas COVID-19 (conhecido como COVAX): é um mecanismo de aquisição conjunta financiada por doadores e liderado pela GAVI e pela OMC. O fornecimento de vacinas é feito diretamente aos Ministérios da Saúde (não às organizações não-governamentais).
  • As negociações bilaterais diretas entre um país e um fabricante: algumas empresas produtoras na Rússia, China ou Índia chegaram a acordos bilaterais com países de rendimentos médios (da mesma forma que a Europa chegou a acordos com empresas fabricantes nos Estados Unidos, no Reino Unido ou na própria União Europeia). É possível que todos estes dados estejam disponíveis nos próximos meses, mas atualmente só o estão parcialmente. Obter vacinas da Pfizer ou da Moderna desta forma é quase impossível para os países de rendimentos baixos e médios, uma vez que os países ocidentais praticamente acumularam as vacinas disponíveis. Neste momento, a maior parte da produção das vacinas atualmente validadas pela OMS está já sob compromisso a países ricos, tornando muito difícil que países de baixos e médios redimentos consigam chegar a acordos bilaterais.
  • Está a ser criada uma “reserva humanitária” como solução de “último recurso” para populações em elevado risco e populações que se encontram em contextos de crises humanitárias.

Doações: as doações podem ser feitas de um país a outro, de uma região a outra ou ao COVAX. No entanto, isso não está a acontecer atualmente dada a corrida global por vacinas e apesar de vários países terem assumido compromissos de compra de vacinas de duas vezes ou três vezes mais que a sua população.
 

9. Qual é o impacto que a MSF teme ou prevê em outras campanhas de vacinação?

A escala maciça das campanhas de vacinação contra a COVID-19 implica outro risco: a escassez de provisões como frascos, seringas, agulhas, equipamentos de proteção individual, espaço para armazenamento na cadeia de frio e de outros materiais. Se todos estes recursos materias e humanos forem usados na vacinação contra a COVID-19, os programas de vacinação contra outras doenças podem ficar comprometidos. Isto deve ser evitado. É também uma preocupação para a MSF que os bloqueios e restrições existentes atualmente em vários países, a concentração de todos os esforços na COVID-19 e a realocação de recursos tenham um efeito negativo em outras vacinações. A interrupção das campanhas de imunização de rotina e da vigilância de doenças preveníveis através de vacinação, assim como a suspensão das atividades de imunização suplementar planeadas, podem resultar numa lacuna crescente na imunização em muitos países. Isto pode levar ao reaparecimento de outras doenças que são preveníveis mediante vacinação e aumentar o risco de surtos e de doenças como o sarampo e a meningite, entre outros.

 

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