Vozes de mães do Níger

Relatos durante o pico de malária e desnutrição

Vozes de mães do Níger

Hospital distrital de Magaria:

Aisha, idade desconhecida, mãe de 11 filhos (2 falecidos), do vilarejo de Angualaia, no Níger

“Casei-me aos 15 anos. Eu tive 11 filhos, mas dois nasceram mortos.

Mohammed Sani é o mais novo dos meus filhos. Ele normalmente está brincando com suas irmãs e irmãos, mas nossa situação econômica é ruim e ele ficou doente duas vezes. Da última vez, ele estava todo inchado: o rosto, o corpo… Ele mal conseguia abrir os olhos. Levei-o ao posto de saúde mais próximo, a 10 quilômetros do nosso vilarejo e depois para outro. A pé. Infelizmente, nada funcionou, então eles me aconselharam a trazê-lo aqui [ao hospital distrital de Magaria]. No início, seu pai se recusou a transferi-lo, mas depois deu sua permissão. Ele melhorou muito desde que chegou ao hospital.

Nossa principal preocupação é comida. As colheitas nunca são suficientes. Às vezes, elas vão bem e nós podemos comer, mas quando são ruins, algumas crianças morrem. Este ano não foi bom; nossos estoques já estão vazios. Quando isso acontece, algumas famílias cultivam fora da estação, outras ganham dinheiro cortando madeira e outras vão à Nigéria para fazer negócios. Meu marido é comerciante e vai regularmente para lá, mas não está vendendo nem comprando nada ultimamente. Tempos difíceis para nós.”

Aiva, 30 anos de idade, mãe de 9 filhos (2 falecidos), do vilarejo de S/broum, no Níger

“Meu filho tem 4 anos de idade [doente de desnutrição e sarampo]. Ele começou a ter febre e manchas vermelhas pelo corpo. Como moramos perto da fronteira com a Nigéria, o levamos primeiro ao centro de saúde de Zongo do outro lado da fronteira. Eles o trataram, mas após nove dias sua condição não havia melhorado. Meus vizinhos no vilarejo me disseram que o melhor era levá-lo ao CRENAS [centro de alimentação terapêutica ambulatorial] de S/broum, apoiado por Médicos Sem Fronteiras (MSF).

O médico me disse que ele tinha ‘tamoa’ [ele estava sofrendo de desnutrição] e sarampo. Eu tenho mais oito filhos. Dois agora estão mortos. Um faleceu há 15 anos, quando ele tinha apenas alguns meses; não sei por quê, ele estava com boa saúde. A malária grave matou a outra, há 7 anos. Eu estava com medo de perder esse também, porque ele estava gravemente doente no começo [em choque séptico, hipoglicêmico e com disenteria].

A vida não é fácil. Temos algumas vacas e somos agricultores. Dinheiro é sempre uma preocupação.

Quando um dos meus filhos adoece, não vou mais aos curandeiros tradicionais. As equipes de MSF nos ensinaram a identificar sinais de perigo, como febre alta ou edema, quando é importante levar nossos filhos a um centro de saúde. Tentamos fazer o melhor por eles.

Ver que meu filho está melhorando me deixa feliz, mas sei que a recuperação vai demorar um pouco.”

Hospital distrital de Madarounfa:

Suadi Abdou, 43 anos de idade, mãe de 9 filhos (todos vivos), do vilarejo de Unkulego, no Níger

“Meu filho nasceu sofrendo. Ele é fraco e não come muito. É a terceira vez que ele adoece este ano. Eu o trouxe primeiro ao centro de saúde de Maraka. Como ele estava em estado crítico, o trouxemos aqui de moto.

Estamos no hospital [Madarounfa] há 2 semanas. No começo, ele não conseguia abrir os olhos devido a edemas. Por quatro dias ele nem sequer urinou. Era difícil vê-lo assim. Agora ele está se saindo muito melhor, ansioso para voltar para casa e brincar com os irmãos novamente.

Eu preparo e vendo ‘beignets’ (bolinhos fritos). Meu marido é agricultor, mas ele não pode fazer tudo o que quer, porque ele não tem os meios para o cultivo fora da estação. Às vezes, não temos dinheiro e esperamos. Nem sempre temos o suficiente para comer. Isso depende da colheita de cada ano. Se é bom, não há problema. Se é ruim, não há nada a fazer senão confiar nos outros.

“Não houve assassinatos ou sequestros em nossa região, mas como temos medo disso, muitas vezes dormimos no mato. Também tememos que pessoas armadas venham roubar nosso gado. Ninguém está 100% seguro. No ano passado, tudo estava mais calmo, não estávamos tão preocupados com a violência. Agora está um pouco tenso, mesmo que autoridades e forças de segurança tenham intervindo.

Minha prioridade é a saúde de nossos nove filhos. Eu quero que eles estejam fortes e protegidos contra doenças. Até agora não perdi nenhuma delas, mas nunca se sabe.”

Centro de saúde da Dan Issa:

Aisha, 30 anos de idade, mãe de 7 filhos (3 falecidos), do vilarejo vizinho de Gurbi na Nigéria, estado de Katsina

“Dois dos meus filhos faleceram de repente. Um tinha 27 dias de vida; o outro, 2 meses. Mais tarde, perdi um terceiro filho em casa: diarreia, vômito… Não pudemos fazer nada.

Quando minha filha ficou doente [de desnutrição], decidi levá-la imediatamente ao centro de saúde de Dan Issa, mesmo que estejamos um pouco distantes [a cerca de 50 quilômetros do centro de saúde]. Agora ela está ganhando peso.
Na Nigéria, onde moramos, a violência é dura: assassinatos, sequestros. Nosso vilarejo, Gurbi, foi atacado quatro vezes. Nove meses atrás, um grande grupo de homens armados chegou do nada. Eles começaram a atirar em qualquer coisa que se mexesse. Houve muitas vítimas. Enterramos os mortos e obtivemos ajuda para os feridos. Quatro meses depois, houve outro ataque e todos fugimos para outras áreas da região. Eu fui para minha cidade natal, com meus filhos. Meu marido ficou em Gurbi, mas dormia no mato, já que as noites costumam ser mais perigosas: é quando os ataques acontecem. Há cerca de três semanas, decidi voltar com ele porque tudo estava calmo, mas estou nervosa.

Não é fácil conseguir comida. A insegurança afetou a agricultura. Algumas pessoas não se atrevem a cultivar suas terras como costumavam fazer, então há menos produtos disponíveis e mais caros.

Só espero que meus outros filhos não fiquem doentes. Ou eu (ela está grávida). ”

 

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