Um primeiro passo bem-vindo, mas Aids também é uma doença negligenciada

Em comunicado, Médicos Sem Fronteiras comenta decisão de laboratório de medicamentos britânico

Médicos Sem Fronteiras(MSF) recebe de bom grado o reconhecimento de Andrew Witty, CEO da empresa farmacêutica GlaxoSmithKline (GSK), de que patentes agem como uma barreira para pesquisas e desenvolvimento, e pools de patentes oferecem novos meios de estimular a pesquisa para doenças negligenciadas. Agora, as promessas precisam ser transformadas em ação. Os termos de quaisquer licenças anexadas a pool de patente vão ser críticos, e mais detalhes são necessários. Fontes de investimento também precisam ser identificadas para desenvolver quaisquer produtos que resultem desta pesquisa.

MSF convoca todas as outras companhias farmacêuticas a suspender as barreiras de patente, e tornar seus compostos moleculares e processos disponíveis, para ajudar no desenvolvimento de tratamentos para doenças negligenciadas, e abrir suas bibliotecas de compostos para pesquisadores.

Mas a GSK tem que estender este pensamento para incluir HIV: esta também é uma doença negligenciada

Andrew Witty afirma que uma pool de patente destina-se a se concentrar em doenças com uma severa falta de tratamentos, e há inovações suficientes para HIV.

Ele está errado. No campo de tratamento de HIV/Aids, a distância entre o que é necessário e o que está disponível é grande. Um pool de patente pode ajudar a diminuir esta distância, e encorajar inovações em lugares nos quais isto não está acontecendo hoje. Nós precisamos de novas combinações de doses-fixas: Nós precisamos desesperadamente de novas combinações de doses-fixas que combinem múltiplos compostos em uma pílula, especialmente aqueles que incluem novos fármacos.

Nós precisamos de novas formulações pediátricas e estudos pediáticos acelerados. Com 90% das crianças HIV positivas vivendo na África Subsaariana, estudos pediátricos e formulações não são uma prioridade para as companhias farmacêuticas. Dos 22 anti-retrovirais aprovados pela Administração de Alimentos e Medicamentos dos Estados Unidos (FDA), oito não são aprovados para o uso em crianças, e nove não vem com nenhum tipo de formulação pediátrica. E quando versões para crianças existem, elas frequentemente não são adaptadas para o uso em locais de recursos limitados (ou exigem refrigeração, ou acesso seguro à água potável, ou são difíces para os responsáveis administrarem as doses corretas). Empresas genéricas tem expressado o interesse e a vontade de desenvolver medicamentos para Aids em formulações de comprimido, que se adequem melhor às crianças. Mas, de novo, as barreiras de patentes podem impedi-las, atualmente, de realizar isto, especialmente para as novos fármacos.

A inovação não faz sentido se não há acesso

A pesquisa, sozinha, não vai assegurar que as pessoas vivendo em lugares pobres vão receber novos tratamentos. A fim de assegurar o acesso aos frutos
da inovação, os produtos resultantes tem que ter preços acessíveis. Ainda assim, MSF, junto com outras que provém tratamento em países em desenvolvimento, continua a lutar com relação à acessibilidade dos antiretrovirais.

A prescrição de Witty é oferecer descontos de pelo menos 75% sobre os preços dos medicamentos. Enquanto qualquer diminuição no valor dos preços é bem-vinda, isso não é, em nenhum sentido, uma panacéia. Experiências já mostraram que a concorrência entre os diversos produtores de genéricos é a forma experimentada e testada de abaixar os preços – caíram entre 95 e 98%, desde 2000, para a primeira geração de antiretrovirais.

A limitação dos descontos de empresas são, especialmente, evidentes quando elas são restritas a apenas os países subdesenvolvidos, e excluem os países de renda média. Países como a China, por exemplo, no qual na ausência de concorrência, a GSK cobra mais de 3 mil dólares pelo anti-retroviral Lamivudina, ou a Tailândia, no qual Abbott se recusou a baixar os preços do termo-estável lopinavir/ritonavir, e só após o país emitir uma licença compulsória é que o preço caiu para 500 dólares, atualmente.

MSF está, portanto, preocupada porque Andrew Witty parece estar excluindo os países com rendimentos médios, oferecendo um pouco mais do que uma promessa de flexibilidade mal-definida de preços para estes países.

A crise dos preços de medicamentos para Aids vai voltar

Cada vez mais, novas drogas estão sendo patenteadas em países chaves da produção genérica, mas a concorrência entre eles não vai mais ser capaz de agir como catalisadora para a redução dos preços, como foi no passado recente.

HIV/Aids é uma doença que requer tratamentos vitalícios, e as pessoas precisam ter acesso a medicamentos mais novos, mais potentes e menos tóxicos caso sintam os efeitos adversos ou desenvolvam uma resistência aos medicamentos.

O esquema de tratamento recomendado pela OMS como primeira linha para Aids custa, no mínimo, entre 600 e mil dólares, usando produtos de marca. Este custo é doze vezes maior se comparado com tratamentos de primeira linhas mais antigos, que,aliás, graças às consequências da concorrência entre os genéricos, está agora disponível por 87 dólares para o tratamento anual de um paciente. Para tratamentos de segunda linha, os preços são, na melhor das hipóteses, dezessete vezes mais caros, em países que não podem ter acessos às versões genéricas devido a proteção de patente.

Novos modos de manter acessíveis os remédios devem ser, portanto, colocados em andamento. Isso pode acontecer através de licenças compulsórias, seguindo exemplos de países como a Tailândia, ou sem a necessidade de confronto e litigação, através de uma pool de patente, como a recente proposta pela unidade de compra de medicamentos UNITAID, para estabelecer uma pool de patente voluntária para remédios de HIV, a fim de serem usados em países de renda média e baixa.

MSF solicita à GSK que colabore com a Unitaid e torne disponível importantes patentes no pool de patentes voluntários para medicamentos de Aids.

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