República Centro-Africana: quase 20 mil sobreviventes de violência sexual foram atendidos por MSF em cinco anos

De acordo com relatório divulgado pela organização, a maior parte dos agressores eram pessoas conhecidas dos sobreviventes.

Vista da área de espera do centro de Tongolo, em Bangui, onde MSF mantém um projeto de atendimento a sobreviventes de violência sexual. © Juan Carlos Tomasi/MSF

Entre 2018 e 2022, Médicos Sem Fronteiras (MSF) tratou mais de 19.500 sobreviventes de violência sexual na República Centro-Africana (RCA), de acordo com um relatório divulgado pela organização. Nesse período, o número de sobreviventes atendidos por MSF triplicou, enquanto outras organizações viram o número dobrar. Mais de 34.400 pessoas que sofreram violência sexual foram atendidas no país durante esses cinco anos, e mais da metade delas (57%) foram atendidas por MSF.

“A violência sexual na RCA é uma emergência de saúde pública tabu e não pode ser tratada apenas como um problema relacionado a conflitos armados”, diz Khaled Fekih, diretor nacional de MSF na RCA. “Apesar de alguns desenvolvimentos positivos nos últimos cinco anos, muitos sobreviventes de violência sexual (95% dos quais são mulheres) não relatam seus casos e não procuram tratamento. São necessárias ações mais concretas por parte do governo da RCA e de outras organizações humanitárias nacionais e internacionais para mudar esta situação”.

Sabemos que o número de pacientes atendidos ainda é apenas a ponta do iceberg.”
– Khaled Fekih, diretor nacional de MSF na RCA.

 

No relatório “Feridas Invisíveis”*, MSF analisa dados quantitativos de vários projetos e respostas de emergência que apoia ou desenvolve na RCA. Embora um número crescente de sobreviventes de violência sexual tenha tido acesso à assistência nos últimos cinco anos, muitas lacunas persistem – de cuidados médicos abrangentes a básicos; de serviços psiquiátricos avançados a apoio psicossocial inicial. Os sobreviventes também não têm acesso à proteção, assim como apoio socioeconômico e jurídico.

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“Os pacientes enfrentam muitas barreiras para procurar atendimento em tempo hábil, incluindo medo, falta de recursos, meios de transporte e tentativas frustradas de busca por cuidados”, diz Liliana Palacios, consultora de saúde de MSF.

“Em alguns locais, MSF recebeu pacientes que viajaram 130 quilômetros, o que pode significar longas horas ou mesmo dias de viagem, devido ao estado precário das redes rodoviárias na RCA. Às vezes, os pacientes procuravam atendimento apenas anos depois de terem sofrido as agressões”, conta Palacios.

Entrada do centro de Tongolo, em Bangui, capital da RCA. © Juan Carlos Tomasi/MSF

Maioria dos agressores eram pessoas conhecidas dos sobreviventes

A violência sexual na RCA vai muito além do conflito. A análise de MSF, que avaliou dados de cinco anos, revelou que a menor parte dos agressores estava armada (aproximadamente 20%) e a grande maioria deles era conhecida do sobrevivente (cerca de 70%).

Infelizmente, a impunidade é flagrante e poucos agressores são condenados. Já os sobreviventes enfrentam estigmatização aguda e outros obstáculos significativos para seguir a vida em suas comunidades. Para ajudar a reintegrá-los na sociedade e para que não sejam penalizados ao procurarem ajuda, os sobreviventes de violência sexual precisam de acesso a apoio jurídico e assistência socioeconômica.

Conheça o trabalho de MSF para apoiar sobreviventes de violência sexual em Bangui

“É necessária uma abordagem coletiva e holística muito mais forte para fazer mais, mais rápido e melhor. Precisa ser uma abordagem centrada no sobrevivente, baseada na confidencialidade, empatia e respeito”, diz Fekih.

*Leia o relatório “Feridas Invisíveis” em inglês aqui .

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