Quatro coisas que você precisa saber sobre refugiados sul-sudaneses no Sudão

MSF abriu um novo hospital para atender os refugiados do Sudão do Sul e a comunidade local

Quatro coisas que você precisa saber sobre refugiados sul-sudaneses no Sudão

Em dezembro de 2019, Médicos Sem Fronteiras (MSF) abriu um novo hospital, de 85 leitos, no estado do Nilo Branco, no Sudão, para aprimorar a qualidade da assistência médica prestada aos refugiados do Sudão do Sul e à comunidade local. O hospital, no campo de refugiados de Al Kashafa, oferece assistência médica primária e secundária a pacientes com condições complicadas, incluindo crianças gravemente desnutridas e pessoas com doenças infecciosas crônicas, como HIV e tuberculose (TB).

1. O Sudão ainda recebe um alto número de sul-sudaneses

Atualmente, cerca de 2,2 milhões de sul-sudaneses¹ vivem refugiados nos países vizinhos depois de escapar da guerra civil em seu país. Hoje, de acordo com o ACNUR, o Sudão abriga mais de 861 mil refugiados sul-sudaneses, perdendo apenas para Uganda.

“Em 2017, vim para o Nilo Branco com 18 membros da minha família, por causa da guerra. Levamos um mês para chegar ao Sudão a pé. Foi difícil e algumas das crianças morreram no caminho, porque não havia comida nem água e estávamos constantemente expostos ao sol”, diz Julia Odok, 24 anos de idade, uma sul-sudanesa refugiada em Malakal.

“Depois da crise no Sudão do Sul, precisei me refugiar com a minha família. Tudo foi destruído na minha região [Alto Nilo]. Perdemos tudo, inclusive nossa casa. Chegamos aqui só com as nossas vidas e tivemos uma resposta acolhedora da comunidade local”, lembra Lino Ernest, médico que trabalha com MSF no Sudão há três anos.

A maior comunidade de refugiados do Sudão do Sul no Sudão está no estado de Cartum e quase todos os estados sudaneses que fazem fronteira com o Sudão do Sul têm números significativos. O estado do Nilo Branco abriga 248 mil refugiado, com 162 mil deles vivendo em campos como Al Kashafa.

Apesar do processo de paz em curso no Sudão do Sul, não houve uma diminuição significativa no número de refugiados no Nilo Branco. Muitos dizem que esperam retomar suas rotinas, mas preferem ficar no Sudão até que a situação se acalme.

2. Existem grandes necessidades humanitárias nos campos

As necessidades de saúde e humanitárias nos campos de refugiados permanecem altas e é crucial continuar ajudando os refugiados e as comunidades locais que os acolhem. Alguns dos principais desafios nos campos são a disponibilidade de água potável, a falta de trabalho remunerado, os limites de circulação e a alimentação insuficiente.

As equipes de promoção de saúde desempenham um grande papel na comunidade. “Vamos examinar as crianças desnutridas nos campos e orientar as famílias para levá-las, caso seja necessário, ao hospital. Conscientizamos a população sobre doenças como cólera, tuberculose, HIV e malária”, diz Butrus Kwathi, supervisor de promoção de saúde. As equipes visitam locais movimentados, como igrejas, mesquitas, escolas, pontos de água e também vão de casa em casa.

“A vida é difícil. Não temos nada: nem casa, nem dinheiro e nem emprego”, diz Julia. “A única coisa que você pode fazer é sentar e esperar. Recebemos lentilhas e sorgo mensalmente, mas nada mais. Não podemos comer lentilhas todos os dias. Isso deixa as crianças vulneráveis a doenças.”

3. A maioria das doenças está ligada às más condições de vida

Os pacientes chegam ao hospital de MSF vindos do campo de Al Kashafa e de outros oito campos próximos, bem como de aldeias vizinhas. A maioria das condições médicas que as equipes de MSF veem no estado do Nilo Branco são causadas pelas condições de vida precárias e superlotadas nos campos de refugiados, como desnutrição, diarreia, infecções do trato respiratório (incluindo tuberculose), malária e doenças de pele.

Em 2019, MSF realizou quase 120 mil consultas em Al Kashafa – quase 10 mil por mês – e admitiu mais de 5 mil pacientes. Na área de triagem, 63% dos pacientes atendidos eram refugiados.

MSF ajudou mais de 670 mulheres a dar à luz, o que equivale a quase dois bebês por dia. Inscrevemos 196 novos pacientes no nosso programa de TB e 94 no nosso programa de HIV.

Os episódios de violência e o sofrimento provocados pelo conflito, juntamente com os desafios da vida como refugiados, e a incerteza sobre o seu futuro, deixaram muitas pessoas com problemas de saúde mental.

“Fornecemos apoio psicossocial às pessoas até que elas se sintam seguras, até que possam retornar à vida normal e se reintegrar à sociedade”, explica AlfatihAlsadig, conselheira de saúde mental.

4. Picos recorrentes de desnutrição

O acesso insuficiente a alimentos, combinado com más condições de vida e outros fatores, leva a picos sazonais de desnutrição. “Os casos de desnutrição recebidos aumentaram de junho a setembro. É o chamado ‘hiato da fome’, durante a estação chuvosa, quando não há nada para colher”, diz Zakina Adam, supervisora de nutrição.

O hospital de MSF em Al Kashafa possui o único centro de estabilização de desnutrição da região. Em 2019, quase mil crianças gravemente desnutridas com menos de cinco anos de idade foram tratadas lá.

“Algumas crianças desnutridas vêm com outros problemas médicos, como diarreia crônica, pneumonia ou doenças de pele. Isso piora a condição delas. Algumas chegam com o corpo todo inchado [edema], o que pode levar à sepse”, diz Zakina.

Ela acrescenta que, às vezes, bebês com menos de seis meses de vida são admitidos porque suas mães não estão conseguindo amamentá-los adequadamente. “Organizamos sessões para ensiná-las, pois é muito importante para os bebês. Meu trabalho é tentar fazer as pessoas entenderem o que as crianças precisam. Quando não posso fazer nada para a criança [sobreviver], fico muito triste.”

MSF trabalha no estado do Nilo Branco desde 2014, após a chegada de um alto número de refugiados do Sudão do Sul que escapavam da guerra civil. Desde então, MSF implementou campanhas de vacinação, respostas a emergências e gerenciamento de unidades de saúde.

Os serviços disponíveis em Al Kashafa incluem transfusão sanguínea, pronto-socorro, alas de maternidade, pediatria e neonatal e serviços de saúde sexual e reprodutiva – incluindo atendimento a sobreviventes de violência sexual. Pacientes com trauma grave e mulheres grávidas que necessitam de cesariana são transferidos de Al Kashafa para hospitais em Kosti e Al Jabaleen, respectivamente.

MSF atua no Sudão desde 1978. Nos últimos anos, nossas atividades estiveram concentradas em cinco estados: Al Gedaref, Cordofão do Sul, Darfur Leste, Darfur Norte e Nilo Branco. Nossas equipes estão prontas para lançar respostas de emergência em outras regiões caso seja necessário. As instalações de saúde de MSF oferecem cuidados médicos gratuitos e de qualidade a refugiados, deslocados internos e comunidades anfitriãs.

 

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