O aquecimento global e o impacto na saúde das pessoas e nos serviços de saúde

O aquecimento global e o impacto na saúde das pessoas e nos serviços de saúde

A mudança climática que deriva das atividades humanas desempenha um papel importante no agravamento de vulnerabilidades e crises já existentes

A consultora de assuntos humanitários da Médicos Sem Fronteiras (MSF) Carol Devine explica nestas Perguntas&Respostas como a organização humanitária vê este problema crescente. A perita descreve o impacto do aquecimento global na saúde das pessoas e como o fenómeno afeta os serviços de saúde que se encontram já em sobrecarga.

Como é que as alterações climáticas se relacionam com as crises humanitárias?

Os riscos do aquecimento global incluem o aumento da frequência e da intensidade de eventos climáticos extremos, assim como das temperaturas, da poluição do ar, de padrões alterados de doenças infecciosas, além da insegurança alimentar e de acesso à água, entre outras questões. Os impactos indiretos incluem instabilidade econémica, política e social. A migração pode ser vista como uma resposta adaptativa à mudança climática. As pessoas mais afetadas são, em geral, pessoas com baixo nível socioeconómico e as que vivem em países em desenvolvimento, onde os serviços e a infraestrutura para resistir aos impactos do clima são mais frágeis. Crianças, mulheres grávidas, idosos e pessoas que já têm algum tipo de doença estão particularmente vulneráveis, por exemplo, a doenças respiratórias e relacionadas com o calor, que são agravadas pelas alterações climáticas.
 

MSF vê impactos nos seus projetos?

As nossas equipas nos projetos já estão hoje em dia a trabalhar em áreas fortemente atingidas pelas alterações climáticas e pela degradação ambiental. Muitos dos projetos da MSF estão localizados em regiões altamente vulneráveis às mudanças climáticas, como o Sul da Ásia e o Pacífico, regiões da África e do Médio Oriente, assim como áreas da Ásia Central, da América Central e das Caraíbas. A MSF realiza grandes programas de nutrição, por exemplo, na região do Sahel (zona de transição entre o deserto do Sara e a savana), que está a passar por secas severas. No Bangladesh e na Nigéria, o acesso das pessoas deslocadas internamente a suficiente água potável é uma preocupação para nossas equipas.
 

Existem doenças específicas tratadas pela MSF que possam estar ligadas às alterações climáticas?

As alterações climáticas têm sido associadas ao aumento do alcance e à multiplicação de vetores de doenças infecciosas, como mosquitos e carrapatos. Em 2012, 2014 e 2015, as equipas MSF observaram picos significativos nos casos de malária em vários países da África subsariana. Embora as razões para os aumentos sejam complexas, entendemos que as mudanças relacionadas com o clima sejam um fator contributivo. Temperaturas mais elevadas também mostraram aumentar a incidência de doenças transmitidas pela água e por alimentos, como a hepatite, a gastroenterite viral e a cólera.
 

O que pode ser feito numa perspectiva humanitária e quais são os próximos passos da MSF?

Assim como as convenções de Genebra limitam os impactos da guerra para os civis, o Acordo de Paris sobre as alterações climáticas visa atenuar o sofrimento humano, limitando a atividade humana que é prejudicial. O tratado tem de ser posto em prática. Como humanitária, estou preocupada, mas também vejo aqui a oportunidade de uma mudança positiva. Em relação ao trabalho da MSF, as nossas equipas no Sudeste Asiático estão a criar uma aplicação que reúne informações para ajudar numa resposta mais rápida em situações de emergência. As alterações climáticas provavelmente amplificarão os tufões, que já são fortes, e as inundações graves. Para reduzir a nossa própria pegada ecológica, temos projetos de energia solar, por exemplo, em Shamwana, na República Democrática do Congo. Em Moissala, no Chade, temos um projeto de energia inovador e estamos a fazer mudanças para tornar a nossa cadeia de abastecimentos cada vez mais eficiente. Mas ainda precisamos fazer mais. Queremos também fazer mais investigação operacional, mais partilha de dados, mais intensa colaboração e planeamento interdisciplinar, ou seja, pensar em soluções que envolvam diferentes áreas de conhecimento. O problema e as soluções são responsabilidade de toda a sociedade.

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