Noma na Nigéria: “A resiliência dos nossos pacientes é impressionante”

Noma é uma doença negligenciada, mas perigosa, que pode deixar pacientes, geralmente jovens, desconfigurados. Hafiz, um cirurgião da Índia, compartilha sua experiência oferecendo cirurgia reconstrutiva na Nigéria.

Noma é uma doença negligenciada, mas perigosa, que pode deixar pacientes, geralmente jovens, desconfigurados. Hafiz, um cirurgião da Índia, compartilha sua experiência oferecendo cirurgia reconstrutiva na Nigéria.

Eu tinha apenas uma leve lembrança do nome da doença que ouvira durante o curso de medicina. Noma? Cancrum oris?

Eu não conseguia me lembrar…

Inspiração

Em 2011, participei de uma reunião organizada pela Associação de Cirurgiões Plásticos, perto da minha cidade natal na Índia. Lá ouvi uma apresentação motivacional sobre o trabalho humanitário de MSF em vários países. Imediatamente após a reunião, falei com o palestrante e iniciei o processo para trabalhar com MSF.

Após meses de espera e muita papelada, fui chamado para uma entrevista em Nova Delhi e logo me foi oferecido meu primeiro projeto.

Eu estava emocionado!

Sendo combinado

Meu primeiro projeto iria ser em Gaza, em 2017, trabalhando como cirurgião de queimaduras reconstrutivas. No entanto, a viagem foi cancelada devido a preocupações de segurança que restringiam nosso acesso.

Como cirurgião plástico reconstrutivo, minhas opções com MSF em minha área de escolha eram limitadas. Eu preferi não optar por trabalhos cirúrgicos gerais ou cirurgia de guerra, mas sim permanecer na minha zona de conforto, que é a cirurgia reconstrutiva.

Então, fiquei muito empolgado quando o escritório de MSF na Índia me ligou e compartilhou comigo as boas notícias – eu fui chamado para outro projeto.

Noma na Nigéria

O trabalho era de cirurgião plástico reconstrutivo para um projeto no noroeste da Nigéria, tratando pacientes com noma.

Eu tinha muita leitura para fazer sobre noma. É uma doença bastante incomum agora, mas ainda amplamente prevalente ao longo do cinturão equatorial, passando pela Nigéria, Chade, Camarões e República Centro-Africana.

No entanto, a conscientização sobre a doença é muito limitada, assim como as opções de tratamento.

Um cirurgião de MSF examina Adamu, um paciente de 14 anos com noma cujo nariz foi destruído pela doença

 

A doença destrói os ossos e tecidos, afetando a mandíbula, lábios, bochechas, nariz ou olhos. Esta gangrena orofacial de rápida disseminação é principalmente um resultado de desnutrição e infecções orais oportunistas em crianças que sofrem de um sistema imunológico já enfraquecido.

A taxa de mortalidade da doença também é alta e muitos pacientes necessitam de cirurgia reconstrutiva.

É aqui que MSF decidiu intervir. E, nos últimos cinco anos, temos apoiado o hospital infantil de noma, na cidade de Sokoto, onde trabalhamos junto ao Ministério da Saúde.

Aprendendo a tratar a doença

A literatura detalhada sobre esta doença também é bastante limitada – um pequeno livro da Fundação Holandesa de Noma compartilhado comigo pelo cirurgião anterior tornou-se minha bíblia para entender a doença.

O livro continha várias fotos e relatos de deformidades faciais causadas pela doença, que me ajudaram imensamente mais tarde, me salvando do choque do desconhecido durante a tarefa.

A equipe cirúrgica de noma em Sokoto, Nigéria

 

A equipe internacional também tinha uma vasta experiência no tratamento de noma, o que me deixou nervoso no começo, já que era a minha primeira vez tratando a doença. No entanto, incentivo constante e bons conselhos da equipe me ajudaram a focar no meu trabalho.

Com o passar dos dias, minhas apreensões diminuíram quando percebi que podia depender de minhas habilidades fundamentais como cirurgião reconstrutivo na maioria das vezes.

O companheirismo entre os profissionais também garantiu que as coisas corressem bem.

Positividade pós-operatória

Acredito que meu tempo usado no projeto valeu a pena. Nós tratamos mais de 27 pacientes e a grande maioria deles demonstrou uma cura excelente.

Todo cirurgião sabe que o cuidado pós-operatório é de vital importância, senão mais do que a cirurgia em si. As rondas da ala eram, portanto, muito importantes e sempre esperei ansiosamente por elas. É também quando se pode ver o corpo humano realizar seu trabalho de cura natural após a cirurgia.

Mais do que qualquer outra coisa, o que realmente me surpreendeu foi a resiliência de nossos pacientes.

Mesmo com a doença, muitas pessoas ficavam de baixo para cima, sorrindo à noite após a cirurgia, muitas vezes nos fazendo pensar se era o mesmo paciente que operamos naquela manhã. 

Raramente alguém reclamava de dor, o que era notável e contrastante com os pacientes saudáveis e em forma que eu regularmente encontro em minha prática diária em casa.

Dizendo adeus

Minha experiência de duas semanas passou em um piscar de olhos.

Em uma memorável cerimônia de agradecimento, os parentes de muitos de nossos pacientes reuniram-se no pátio do hospital no último dia e compartilharam sua gratidão por meio de uma apresentação de dança tradicional.

Foi uma noite encantadora e a energia dos artistas obrigou até mesmo o dançarino tímido e horrível que existe em mim a se juntar à diversão.

Espero voltar em breve!

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