“NÃO HÁ TEMPO A PERDER”: número de mortes por Aids está estagnado devido à falta de testes básicos

Um relatório de 15 países sobre o progresso na luta contra o HIV avançado

“NÃO HÁ TEMPO A PERDER”: número de mortes por Aids está estagnado devido à falta de testes básicos

Centenas de milhares de pessoas continuam a morrer de HIV avançado, também conhecido como Aids, porque os países ainda estão mal equipados para detectar e tratar pessoas que sofrem com estágios avançados da doença, de acordo com um novo relatório divulgado hoje pela organização Médicos Sem Fronteiras (MSF). Atrasos na resposta rápida às falhas e interrupções do tratamento comprometem o progresso recente na redução das mortes por HIV.

MSF pede aos países afetados e aos países doadores que implementem urgentemente as abordagens recomendadas para prevenir, detectar e tratar a Aids e o HIV avançado em nível comunitário.

O relatório “Não há tempo a perder” abrange 15 países da África e da Ásia e apresenta um painel de onde os países estão em termos de políticas, implementação e financiamento para lidar com o HIV avançado, que matou 770 mil pessoas em todo o mundo em 2018. Apesar da existência de diretrizes da Organização Mundial da Saúde (OMS) desde 2017 sobre o HIV avançado, os governos têm demorado a inclui-los nas diretrizes nacionais, enquanto a implementação e o financiamento significativos ficam ainda mais atrasados.
    
As diretrizes da OMS recomendam a implementação de testes rápidos e fáceis de usar para avaliar o status do sistema imunológico das pessoas (a contagem de células CD4) e para diagnosticar as infecções oportunistas mais comuns e mortais, como a tuberculose (teste de urina TB-LAM) e meningite criptocócica (teste CrAg). Esses testes podem fornecer resultados em questão de horas e, combinados com a proximidade dos pacientes, o tempo – às vezes dias – ganho pode fazer a diferença entre vida e morte para muitos.

No entanto, MSF descobriu que os testes rápidos quase nunca estão disponíveis no nível da comunidade, apesar do fato de que a detecção precoce pode salvar muitas vidas.

“Não há como o mundo atingir a meta de menos de 500 mil mortes por Aids em 2020 sem uma ação decisiva para lidar com a adesão nos cuidados, interrupções do tratamento e mortalidade resultante”, diz o dr. Gilles Van Cutsem, conselheiro sênior de HIV de MSF. “No passado, os pacientes muito doentes que vimos eram aqueles que não sabiam que tinham HIV. Hoje vemos mais e mais pessoas que foram tratadas antes, mas pararam de tomar seus remédios e ficaram gravemente doentes e pessoas cujo tratamento parou de funcionar.”

Mais de dois terços dos pacientes com HIV avançado admitidos no hospital apoiado por MSF em Nsanje (Malauí) já chegaram muito doentes e já haviam feito tratamento antirretroviral (ARV) antes. No hospital de Kinshasa (capital da República Democrática do Congo) de MSF, esse número é de 71%. Entre elas, mais de uma em cada quatro pessoas morre porque a doença estava muito avançada quando chegaram ao hospital. Essas mortes poderiam ter sido evitadas.

Desde que MSF disponibilizou os testes rápidos nos centros de saúde do distrito de Nsanje, o número de mortes no hospital diminuiu de cerca de 27% para menos de 15%.

Apenas oito dos 15 países pesquisados no relatório usam o TB-LAM rápido para testar pacientes com HIV avançado. Eles são usados em hospitais na África do Sul e espera-se que sejam disponibilizados no nível comunitário. O Malauí planeja encaminhá-los para 230 centros de saúde em 2020, e programas piloto para introduzir o teste estão sendo lançados no Lesoto e na Nigéria. Outro piloto foi concluído recentemente no Quênia antes de um possível lançamento nacional do teste.

Apenas um terço dos países recomenda usar o teste rápido para meningite criptocócica (que representa 15-20% de todas as mortes relacionadas ao HIV avançado) para pacientes com sistema imunológico muito fraco, incluindo Quênia, Moçambique, África do Sul, Sudão do Sul, Uganda e Zimbábue, mas a maioria desses países ainda não implementou essa recomendação no terreno.

Atualmente, os testes TB-LAM e CrAG no nível de atenção primária à saúde estão disponíveis apenas nos centros de saúde apoiados por MSF nos 15 países cobertos pelo relatório.

Os objetivos globais 90-90-90 do UNAIDS (90% das pessoas que vivem com a doença sabem seu status, 90% das pessoas que vivem com HIV recebem tratamento e 90% das pessoas em tratamento têm níveis indetectáveis do vírus no corpo) assumem uma sucessão de estágios de uma maneira linear, mas a realidade é que o modelo é circular para muitas pessoas que precisam voltar aos testes e iniciar as fases após terem passado por esses estágios no passado.  

“Todos nós precisamos aceitar que o trabalho não termina quando as pessoas estão em tratamento e se saindo bem. Temos que estar presentes para as pessoas durante toda a jornada de tratamento, o que significa a vida inteira dessas pessoas”, diz Florence Anam, coordenadora de relações institucionais de MSF para HIV / TB e principal autora do relatório. “Nós não acabaremos com os danos do HIV cavando mais túmulos, mas fazendo todo o possível para manter as pessoas saudáveis, não importa onde elas morem e quais sejam as circunstâncias de sua vida. Eles devem ser apoiadas mental e clinicamente o mais próximo possível de onde vivem.”

Alguns países como Lesoto, Malauí, Quênia e Uganda começaram a fazer progressos iniciais na implementação avançada das diretrizes para o HIV, mas precisarão ser apoiados financeiramente. Os doadores devem priorizar abordagens para reduzir a mortalidade ligada à Aids.

Observações:

MSF desenvolveu o Painel da Doença do HIV Avançado para documentar o progresso da implementação de políticas do gerenciamento da doença do HIV avançado em 32 países. O Painel é uma ferramenta para rastrear e monitorar o status da política nacional e promover sua tradução em prática, concentrando-se em fatores que auxiliam na implementação eficaz. Isso inclui a adoção das Diretrizes da OMS para o gerenciamento da doença do HIV avançado e o início rápido da terapia antirretroviral no nível do país, o fornecimento de um pacote de cuidados, a obtenção de recursos para produtos de diagnóstico e tratamento para o HIV avançado.

O progresso de 15 dos 32 países no painel foi destacado neste relatório. Os países destacados são: República Centro-Africana (RCA), República Democrática do Congo (RDC), Eswatini, Guiné, Índia, Quênia, Lesoto, Malauí, Moçambique, Mianmar, Nigéria, África do Sul, Sudão do Sul, Uganda e Zimbábue. Esses países foram selecionados devido à sua alta carga de HIV, mortes relacionadas à Aids e proporções de morbimortalidade devido à tuberculose e meningite criptocócica. São também países onde MSF trabalha para implementar projetos de HIV/TB, inclusive com projetos para pacientes com HIV avançado.  

De novembro de 2018 a outubro de 2019, acompanhamos o progresso dos países acima mencionados, realizando uma análise de área de trabalho dos documentos de políticas nacionais de cada país, principalmente as diretrizes nacionais. Os dados foram verificados pelos escritórios de MSF no país. Além disso, MSF, em parceria com a CDC Foundation, enviou um questionário de mapeamento para os 15 escritórios de MSF nos países para fornecer informações mais detalhadas e pediu para que eles fossem compartilhados com os colegas do Ministério da Saúde para que eles participassem do preenchimento dos questionários de mapeamento.

Este relatório é um trabalho em andamento sobre o monitoramento da adaptação e implementação por países dos pacotes de cuidados da doença do HIV avançado e constitui uma linha de base a partir da qual as atualizações e relatórios subsequentes podem ser desenvolvidos no futuro.
 

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