COP30: MSF destaca respeito a saberes ancestrais na saúde

“Só conseguimos enfrentar problemas de saúde com adesão e respeito”, afirma Renata Reis, diretora de MSF-Brasil

Renata Reis, ao centro, participa da mesa “Saúde e Adaptação Climática: mulheres indígenas e negras e a cura da Terra”, durante a COP30 no Brasil. ©Diego Klein

O trabalho de assistência em saúde para povos indígenas e tradicionais exige que as organizações que o realizam respeitem e incorporem saberes destas comunidades. “Se os povos que estão acometido por algum problema não se convencem de que o que você está fazendo é o melhor e que o jeito e a cultura deles estão sendo respeitados, eles não vão fazer”, explicou a diretora-executiva de Médicos Sem Fronteiras no Brasil, Renata Reis. “Só conseguimos enfrentar problemas de saúde com adesão e respeito”, afirmou. 

Ela participou nesta terça-feira, 13 de novembro, do debate “Saúde e Adaptação Climática: mulheres indígenas e negras e a cura da Terra”, realizado no Pavilhão Azul da COP30, em Belém.  

A diretora citou o exemplo do trabalho realizado por MSF na Terra Indígena Yanomami (TIY), onde MSF prestou assistência de saúde após a decretação da emergência sanitária, no início de 2023. “A enfermaria Yanomami que a gente reformou junto com o Ministério da Saúde tem fogo no meio”, explicou, referindo-se às fogueiras instaladas no chão do pólo-base, perto das quais são penduradas as redes onde ficam os pacientes, utilizadas como leitos, em vez das camas hospitalares tradicionais. 

Em 2024, MSF realizou atividades de saúde mental com comunidades Yanomami e Ye’kwana, promovendo bem-estar a partir de uma abordagem integrada ao território. ©Diego Baravelli

“Tem a nossa parte e a parte deles e é possível combinar”, contou. “A gente chega com os nossos protocolos ocidentais, mas a gente faz com eles. Os pajés nos falaram: ‘Nós somos médicos iguais a vocês’, e é claro que são mesmo. É assim que tem que ser.” 

Do debate participaram também a pesquisadora em saúde e clima Adriani Guarani e Giovana Mandulão, secretária Nacional de Articulação e Promoção de Direitos Indígenas do Ministério dos Povos Indígenas. 

A conversa acabou sendo também um reencontro da secretária com MSF, já que sua comunidade, macuxi, foi atendida no início da década de 1990 durante a resposta a uma epidemia de cólera em Roraima, um dos primeiros projetos realizados pela organização no Brasil. 

Eu era criança quando eles foram fazer atendimento na minha aldeia. A gente não tinha atendimento, porque você tinha que sair para a capital, que eram mais de 150 km.”

– Giovana Mandulão, secretária Nacional de Articulação e Promoção de Direitos Indígenas do Ministério dos Povos Indígenas. 

Na época, atendendo a um pleito dos indígenas, as equipes de MSF se instalaram dentro das comunidades para trabalhar em proximidade com a população. Desta forma, a resposta à malária foi bem-sucedida, e MSF também deixou um legado, realizando o treinamento de agentes de saúde e microscopistas indígenas. 

Renata Reis lembrou que em muitos outros lugares onde MSF está presente, a organização testemunha o impacto da crise climática sobre populações já vulnerabilizadas. “Eles são os primeiros a responder. Eles têm as tecnologias ancestrais para sobreviver naqueles contextos. Nosso papel como organização humanitária é potencializar essas vozes e esses saberes”, afirmou.  

Ela defendeu que os conhecimentos tradicionais sejam uma ferramenta importante para enfrentar os desafios da adaptação e mitigação climática na saúde. “A gente tem que lutar contra a hierarquização dos saberes. A resposta da saúde vai vir na combinação do trabalho médico com o trabalho das comunidades”, concluiu. 

 

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