Milhões ainda aguardam a revolução da Aids

MSF lança série de filmes “Veja o que nós vemos”

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A luta contra o HIV/Aids tem sido louvada como um dos projetos de saúde pública mais bem-sucedidos da história da humanidade, mas equipes da organização humanitária internacional Médicos Sem Fronteiras (MSF) veem que a revolução não chegou a milhões de pessoas que são excluídas do acesso ao tratamento.

Hoje, MSF lança uma série de filmes intitulada “Veja o que nós vemos” – see.msf.org.br – , para contrapor a retórica do progresso onipresente e a luta contra o HIV/Aids como quase ganha.
 
Apenas uma semana antes de uma reunião fundamental de compromisso com o Fundo Global de Combate à Aids, Tuberculose e Malária, sediada nos Estados Unidos, MSF expressa sua preocupação com a possibilidade de o financiamento não atingir o mínimo previsto em planejamento, de US$ 15 bilhões, o que significaria deixar sem suporte alguns países com HIV/Aids endêmico, minando a dinâmica construída ao longo dos 12 últimos anos.
 
“Mortes causadas pela Aids são, agora, uma raridade em países ricos, mas, todos os dias, 4 mil pessoas, sendo a maioria de países em desenvolvimento, ainda morrem desnecessariamente devido à doença”, afirma o Dr. Gilles van Cutsem, diretor médico de MSF para a África do Sul e o Lesoto.
 
Na maioria dos lugares com altos índices de HIV, como a África do Sul, a Suazilândia e o Malauí, o acesso à terapia antirretroviral (ART) melhorou drasticamente na última década. Mas, hoje, de acordo com a Unaids, uma em cada quatro pessoas que começam o tratamento para HIV em países de baixa e média rendas o fazem de forma perigosamente tardia.
Em diversos países onde MSF atua – como República Democrática do Congo (RDC), Guiné, República Centro-Africana, Nigéria, Sudão do Sul e Mianmar – o tratamento oportuno continua fora de alcance para a maioria das pessoas que precisam dele urgentemente. Isso apesar do fato de que se considera que esses países tenham baixa prevalência de HIV.
 
“Aqui em Kinshasa a situação é extrema. É comum que vejamos pessoas chegando em nosso hospital quando já estão em estado crítico, com a Aids em estágio extremamente avançado. Para muitas pessoas, é tarde demais e elas estão literalmente morrendo em nossa porta. Cerca de 25% não sobrevivem e 39% das mortes ocorrem nas primeiras 48 horas”, conta a Dra. Maria Machako, funcionária do hospital de MSF na RDC. “O acesso a testes e tratamento é fatalmente reduzido para aqueles que precisam, enquanto o estigma, por sua vez, é grande por todo o país.”
 
Na RDC, as estimativas mais otimistas indicam que menos de 30% das 243 mil pessoas que são elegíveis ao tratamento antirretroviral têm, hoje, acesso a ele. Elas enfrentam sofrimento desnecessário e morte prematura. De forma geral, a cobertura na África Central e Oriental com tratamento permanece a mais baixa do continente – apenas 34%. Na Guiné, menos de 20% das crianças que precisam de tratamento têm acesso a ele e menos de metade das gestantes infectadas com HIV têm acesso a medicamentos antirretrovirais para proteger seus filhos da infecção.
 
“Quando observamos a situação desesperadora em países como a RDC e a Guiné, sentimos como se estivéssemos parados no tempo. As complicações graves da Aids em estágio avançado nos lembram do que testemunhamos no sul da África antes dos anos 2000, quando o ART não estava disponível e as mortes aconteciam por todos os lados”, afirma o Dr. Eric Goemaere, que deu início a um dos primeiros programas de tratamento de HIV de MSF, próximo a Cidade do Cabo.
 
Hoje, a Aids ainda é a causa número um de morte de jovens mulheres em idade reprodutiva – não apenas em subúrbios da África subsaariana, mas globalmente. O impressionante é que três em cada quatro gestantes com HIV não estão recebendo tratamento – todas elas em países em desenvolvimento.
 
O Lesoto aparece entre os três países com o maior índice de mortes maternas do mundo. “Aqui, a cobertura dos antirretrovirais para mulheres grávidas baixou de 76%, em 2011, para 58%, em 2012. Essa redução fatal também pode ser observada na cobertura do ART de forma geral, que caiu de 61%, em 2011, para 51%, em 2012”, conta Syanness Tunggal, coordenador do projeto de MSF no Lesoto. “Com a cobertura do tratamento menor, reduzir as mortes maternas torna-se extremamente difícil – principalmente quando 58% dessas mortes estão associadas à Aids.”
 
Os vídeos “Veja o que nós vemos” – see.msf.org.br – revelam o que a equipe médica de MSF testemunha e também destacam estratégias assertivas para os cuidados baseados na comunidade, que colocam mais pessoas em tratamento e de forma mais precoce, ajudando-as na adesão no longo prazo.
 
“A visão dos líderes e as políticas nacionais precisam mudar radicalmente. Apenas confiar em sistemas de saúde tradicionais não vai manter as pessoas vivas”, diz o Dr. Ernest Nyamato, representante-adjunto de MSF para a África do Sul e o Lesoto. “Estamos provando que as pessoas podem começar os cuidados para HIV mais cedo e que elas podem conseguir o tratamento por meio das redes comunitárias, aliviando o fardo de instalações de saúde sobrecarregadas e melhorando a adesão das pessoas. Mas alguns governos são resistentes a ceder às comunidades um papel maior em seu próprio tratamento. Isso precisa mudar.”

Notas:
– Equipes de MSF atuam prestando suporte ao tratamento para HIV para mais de 280 mil pessoas em 21 países.
– Sobre os filmes de MSF “Veja o que nós vemos” – see.msf.org.br :
  – O site see.msf.org.br contempla seis vídeos de dois minutos que destacam os diferentes desafios das pessoas que vivem com HIV atendidas por MSF na República Democrática do Congo, Lesoto, África do Sul e Mianmar. Os problemas envolvem a falta de testes para HIV, pessoas iniciando o tratamento para HIV tarde demais para sobreviver, pessoas batalhando para continuar o tratamento para HIV, as crianças com HIV negligenciadas, gestantes morrendo de Aids e a discriminação contra pessoas vivendo com HIV. O site também apresenta um documentário de 16 minutos que resume essas questões e destaca soluções efetivas no combate a tais problemas.

– Sobre o Fundo Global:
  – O Fundo Global é a maior fonte de financiamento para HIV, responsável por quase 20% do total da assistência internacional multilateral disponível para a resposta ao HIV.
No final de 2012, as concessões do Fundo Global deram suporte a cerca de 40% das pessoas em tratamento ARV por todo o mundo. Para muitos países epidêmicos, os programas de resposta seriam gravemente debilitados sem o suporte do Fundo Global.

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