Iraque: quem são os profissionais humanitários que trabalham com MSF?

Iraquianos representam mais de 90% das 1.700 pessoas que trabalham com MSF no país

Iraque: quem são os profissionais humanitários que trabalham com MSF?

Quando Suhaib Majed ouviu falar de uma organização que pretendia contratar pessoas em Hammam Al-Alil, norte do Iraque, em 2017, ele se dirigiu diretamente ao souk (mercado tradicional) onde as inscrições estavam sendo feitas. Ele não estava muito otimista e achava que não conseguiria um cargo se não tivesse ninguém para apoiá-lo no processo de recrutamento. Além disso, seu currículo estava praticamente vazio. Mas ele não tinha nada a perder e decidiu tentar.

“Quando me inscrevi para trabalhar em Médicos Sem Fronteiras, estava procurando um emprego como qualquer outro desempregado”, diz Suhaib. “Também pensei, pelo nome da organização, que só contratavam médicos.”

Ele então percebeu que havia vagas para tradutores, farmacêuticos e logísticos. Logo, ele foi contratado como tradutor, após passar no exame e na entrevista.

Protestos recentes no Iraque mostraram que não é fácil para os iraquianos, especialmente os jovens, encontrar empregos. Em Mossul, como em outras cidades do país, as oportunidades são particularmente limitadas.

Durante as operações militares de 2017 para retomar a cidade, várias organizações internacionais chegaram para ajudar as pessoas. E apesar da tragédia das batalhas em curso, centenas de iraquianos de Mossul e arredores tiveram uma chance inesperada de um novo tipo de trabalho.

Médicos Sem Fronteiras (MSF) é uma das muitas organizações não governamentais que atendem às grandes necessidades humanitárias na área. Mas, apesar do nome bastante autoexplicativo, o trabalho da organização médica não pode ser realizado sem os esforços de sua equipe não médica, atuando nos “bastidores”. Em MSF, as funções das equipes médica e não médica são igualmente importantes na prestação de cuidados de saúde às pessoas.

Suhaib já trabalhou com MSF em quatro posições diferentes, nenhuma delas médica. Sua posição atual é baseada no abrangente centro de cuidados pós-operatórios no oeste de Mossul. Como coordenador de campo, ele representa MSF junto às autoridades locais. Ele se mantém informado sobre a evolução da área, e sua paixão pela escrita o ajuda a elaborar relatórios periódicos que contribuem para a continuidade das atividades do projeto.

Muitas pessoas também geralmente imaginam o trabalho de organizações internacionais como MSF, no Iraque e em toda a região, sendo feito por estrangeiros, o que às vezes levanta suspeitas. A colega de Suhaib, Yasmine Mohammed, que trabalha como vigia no centro, explica que a aceitação das organizações humanitárias não era muito alta quando começaram a trabalhar em Mossul após a batalha para retomar a cidade então nas mãos do grupo Estado Islâmico.

“Não foi muito favorável para os iraquianos trabalharem com organizações no início. A comunidade não gostou da ideia de trabalharmos com estrangeiros, considerando os eventos que o Iraque testemunhou por mais de uma década”, afirma Yasmine. “Mas a percepção mudou quando essas organizações começaram a fornecer serviços tão necessários. Mossul não teria começado a se recuperar se não fosse por isso.”

Com o tempo, as pessoas que chegavam para prestar serviços também puderam ver que, assim como Yasmine ou Suhaib, a maioria dos profissionais da organização era formada por iraquianos. Na verdade, os iraquianos representam mais de 90% das 1.700 pessoas que trabalham com MSF no país. Suas funções são diversas, de motorista a médico, de limpador a técnico biomédico, de farmacêutico a oficial de suprimentos e muito mais.

Ainda assim, o papel de cada pessoa é considerado vital para o funcionamento do projeto. Todos trabalham arduamente para realizar suas tarefas, e esses esforços formam um efeito borboleta que tem um grande impacto quando se trata do quadro geral. Sem a equipe iraquiana, as atividades de MSF não ganhariam vida e permaneceriam funcionando.

Para Yasmine, a contribuição consiste na busca de profissionais femininas, pacientes e visitantes antes de entrarem nas instalações. Ao fazer isso, ela pergunta como estão e os recebe com simpatia. Ela adora seu trabalho porque lhe dá a chance de elevar o astral das pessoas.

Do outro lado do rio Tigre, no leste de Mossul, uma equipe iraquiana dedicada também está trabalhando para tornar possíveis as atividades de MSF no hospital de Nablus. Abdallah Zarzour vê um enorme valor agregado em seu papel como chefe dos cozinheiros e o executa com dedicação.

“Um vigia protege o hospital de perigos externos em potencial, enquanto eu preciso proteger os pacientes de ameaças internas”, comenta Abdallah. “Preparar comida para as pessoas é uma grande responsabilidade. Respeitamos os mais altos padrões de segurança e higiene ao preparar as refeições para os pacientes e seus cuidadores.”

Ele sofreu muitas perdas na vida, mas sempre consegue retribuir e fazer as pessoas felizes. Quando questionado sobre como está indo, ele sempre responde com versos de poesia, refletindo seu intelecto e amor pela vida em sua natureza agridoce.

Sua colega Nour Al-Zouhairy, que é supervisora de dados médicos, trabalha no hospital de Nablus há cerca de dois anos. Ela também acredita que está ajudando indiretamente sua comunidade.

“Coletar dados médicos significa identificar os problemas de saúde de que as pessoas sofrem, o que nos ajuda a adaptar nossas atividades de acordo com as necessidades”, avalia Nour. “Isso me faz sentir que meu papel de repassar informações sobre o sofrimento das pessoas é muito importante, mesmo que eu não faça parte diretamente da equipe médica.”

É muito importante para Nour ajudar as pessoas de uma forma ou de outra. Ela está feliz por contribuir auxiliando sua cidade, Mossul, assim como seus pais que trabalham no setor de saúde pública.

Todos os nossos profissionais trabalhando em Mossul têm histórias de resiliência e perseverança para contar, histórias que dão outra dimensão à vida da cidade. Suhaib, Yasmine, Abdallah e Nour são quatro dos muitos profissionais iraquianos não médicos que merecem crédito e reconhecimento. São essenciais e o que torna possível a assistência ao povo de Mossul. Como muitos outros trabalhadores humanitários no Iraque e em outros lugares, todos eles insistem em ajudar sua comunidade e acreditam que podem realizar isso por meio de suas tarefas diárias. Todos eles avançam, na esperança de um amanhã melhor.

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