Iraque: expectativas encontram a realidade

O logístico libanês Mustafa só deveria estar no Iraque por seis meses, mas estendeu sua missão no país

Iraque: expectativas encontram a realidade
Eu não sabia muito sobre trabalhar para uma organização internacional, mas decidi experimentar. E, com o passar do tempo, tornou-se uma paixão para mim. Ouvi falar de Médicos Sem Fronteiras por coincidência. No começo, eu pensava que a organização era formada apenas por médicos e enfermeiros. Era estranho candidatar-se a um cargo de coordenador de suprimentos. Inicialmente, trabalhei no escritório do Líbano até decidir ir ao Iraque em 2018.
 
Sabemos muito sobre o Iraque pelas notícias e eu soube mais sobre a situação da saúde no país a partir dos documentos que me foram fornecidos antes de começar no projeto. Também tive conversas com outros profissionais que estiveram no Iraque, a fim de entender melhor o trabalho pela frente.
 
Eu me sentia nervoso de uma forma positiva com a ideia de trabalhar no exterior. Foi uma decisão pessoal que tomei para ganhar novas experiências e mudar meu estilo de vida. No entanto, no meu primeiro dia no Iraque, meus colegas já estavam me esperando e me receberam calorosamente. Era algo que eu não esperava.
 
Iraque: o contexto
 
Entre 2003 e 2014, o Iraque experimentou anos de guerra e conflito, forçando cerca de 5,7 milhões de crianças e adultos a fugirem de suas casas. Quase 4,2 milhões de pessoas retornaram, mas o Instituto de Migração estima que 1,8 milhão de pessoas ainda estejam deslocadas.
 
Durante a mais recente ofensiva militar na cidade de Mossul, entre 2016 e 2017, nove dos 13 hospitais públicos foram danificados. O processo de reabilitação desses estabelecimentos de saúde tem sido muito lento. E, até alguns meses atrás, menos de 1.500 camas estavam disponíveis para um número total de 1,8 milhão de pessoas – o que é menos da metade do padrão global mínimo para assistência médica humanitária.
 
Como parte de uma resposta a isso, MSF agora mantém um hospital materno-infantil e de emergência no oeste da cidade e uma instalação de cuidados cirúrgicos e pós-operatórios no leste. Em julho de 2018, MSF também começou a oferecer serviços de saúde mental na cidade.
 
Reabilitação
 
No Iraque, trabalhei em dois projetos de MSF, na cidade de Mossul e de Al Sadr. Eu era responsável por garantir que eles tivessem os medicamentos e suprimentos médicos necessários para tratar os pacientes e se manter com eficiência.
A guerra esgotou os iraquianos e o país ainda está lidando com as consequências de mais de uma década de intervenções estrangeiras e a “guerra ao terror”. Foi uma experiência difícil e dolorosa que tornou o acesso à saúde um desafio diário. O próprio sistema de saúde não se recuperou totalmente.
 
Apesar de tudo isso, o Iraque está passando por um período de transição de reconstrução.
 
Planos para 2020
 
Um dos desafios que o povo iraquiano enfrenta é uma grande lacuna entre os serviços de saúde de que precisam e o que está realmente disponível. Um exemplo é a saúde mental. As pessoas afetadas pela violência, os feridos de guerra ou os que perderam seus parentes no conflito, todos têm necessidades de saúde mental, com poucos serviços disponíveis para ajudar.
 
Atualmente, MSF mantém em Mossul um projeto de saúde mental. E depois de avaliar o que as pessoas mais precisam, em breve iniciaremos novos serviços de maternidade, juntamente com outros planos para o final de 2019.
 
Também estamos estabelecendo um “roteiro” em caso de alguma emergência que o Iraque possa encontrar. Estamos planejando como responderíamos e que soluções alternativas seriam necessárias para manter nossos projetos abertos para pessoas que precisam de cuidados.
 
É por isso que estendi minha missão até 2020. Em 2018, eu deveria viajar para o Iraque por apena seis meses. No entanto, estou convencido de que, durante a fase de lançamento de um novo projeto, é melhor não mudar a pessoa responsável, pois isso pode potencialmente nos fazer dar muitos passos para trás.
 
Iraque: expectativas encontram realidade
 
Trabalhar em um país estrangeiro com pessoas de diferentes culturas e nacionalidades é uma experiência em si. A diferença é perceptível em muitos níveis, e eu adquiri muito conhecimento por estar aqui.
 
É verdade que o Iraque é um país árabe: falamos a mesma língua e compartilhamos algumas tradições, mas cada país tem suas próprias especificidades e cultura.
 
Eu aprendi muito sobre os iraquianos, especialmente sobre o respeito que eles têm pelos pais e o grande papel que desempenham na vida de seus filhos. Eu me acostumei a conhecer muitas pessoas novas o tempo todo. Estar no Iraque me ajudou a perceber que, sejam quais forem as suas expectativas, elas sempre serão diferentes da realidade do que você vê e experimenta em um novo país. Trabalhar em um projeto de MSF definitivamente requer sacrifício e flexibilidade ao mesmo tempo.
 
Próxima parada: América Latina
 
Sinto que essa experiência mudou meu caráter. Tornei-me mais compreensivo e mais calmo ao tomar decisões, seja no trabalho ou na minha vida pessoal. Eu aprendi a viver com pessoas de diferentes características. Aprendi a me comunicar de maneira transparente e a expressar meus sentimentos de maneira útil. Eu também aprendi mais sobre mim do que sabia antes.
 
Depois do Iraque, estou fazendo uma pequena pausa, no entanto, gostaria de trabalhar para MSF em uma nova região, longe do Oriente Médio.
 
Gostaria particularmente de ir a um país de língua espanhola, como Venezuela ou México, onde o contexto, as necessidades e os projetos de saúde são diferentes daqui do Oriente Médio.
 
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