Iêmen: necessidades de saúde aumentam em Marib

Como efeito direto dos seis anos de guerra, pessoas internamente deslocadas em Marib vivem em condições precárias e enfrentam dificuldades no acesso à saúde

Iêmen: necessidades de saúde aumentam em Marib

Espalhados pela província de Marib, no nordeste do Iêmen, há 134 acampamentos – lar temporário de iemenitas deslocados de suas casas pelo conflito de seis anos, migrantes africanos presos no país e membros de um grupo minoritário vulnerável conhecido como Al-Muhamasheen.
 
Antes do início do conflito, Marib era o lar de quase 400 mil pessoas, de acordo com as autoridades locais. Agora, abriga cerca de 2,7 milhões de pessoas, incluindo deslocados de outros lugares, todos em busca de um porto seguro. No entanto, Marib não é mais um lugar seguro para se estar. Nas últimas semanas, a linha de frente do conflito mudou-se para o leste, em direção à província. No dia 8 de fevereiro, os combates aumentaram no distrito de Sirwah, a oeste da cidade de Marib, causando um grande número de feridos e forçando aproximadamente 10 mil pessoas a fugir. Cerca de 600 famílias se instalaram em um acampamento a 20 km da cidade. MSF doou medicamentos essenciais para hospitais em Marib para ajudá-los a lidar com o fluxo de feridos e começou a fornecer cuidados básicos de saúde para os recém-deslocados.

Conforme a linha de frente se aproxima da cidade de Marib, MSF está preocupada, porque as pessoas abrigadas na área talvez não tenham nenhum outro lugar para ir.

Um Marzouk tem 30 anos e é mãe de cinco filhos. Ela é de Nehim, na província de Sanaa. Deslocada várias vezes pelo conflito, Um e sua família agora vivem no acampamento de Al-Sweida, a 5 km da cidade de Marib.

“Fomos deslocados cinco vezes por causa dos combates”, disse Um Marzouk. “Agora é difícil até pensar em voltar para nossa casa em Nehim, porque foi completamente destruída. Dois dos meus filhos nasceram em acampamentos diferentes e foi muito difícil – dei à luz uma criança sem nenhum cuidado médico.”

A família de Um Marzouk é apenas uma entre milhares que buscaram refúgio em Marib nos últimos seis anos, principalmente nas províncias de Al-Jawf, Saada, Hajjah, Hodeidah e Sanaa. A filha de três anos de Um Marzouk, Jadel, nasceu no campo de Al-Sweida. A vida em um acampamento, sem água corrente ou eletricidade, é tudo o que ela conheceu. Quando lhe é mostrado o desenho de uma casa, ela não demonstra expressão, mas o desenho de uma tenda imediatamente traz um sorriso de reconhecimento ao seu rosto.

A equipe de MSF em Marib mantém duas clínicas móveis, que visitam regularmente oito locais diferentes na cidade de Marib, oferecendo às pessoas cuidados básicos de saúde, saúde reprodutiva, vacinas, tratamento para desnutrição e serviços de saúde mental. Também encaminham crianças com desnutrição e infecções do trato respiratório e mulheres com necessidade de atendimento obstétrico de emergência.

“As necessidades são evidentes em qualquer lugar onde levamos nossas clínicas móveis”, diz a enfermeira de MSF Jethro Guerina. “O número de pacientes em nossas clínicas móveis está aumentando dia a dia. Algumas pessoas aqui não são atendidas por um médico há muito tempo, se é que alguma vez já foram.”

Outro local visitado pelas equipes móveis de MSF é o acampamento de Bin Muili, lar de migrantes de vários países africanos. A maioria dos cerca de 6 mil migrantes africanos em Marib vem da Etiópia e estava indo para a Arábia Saudita antes de ficar presa no norte do Iêmen. Alguns estão presos há vários anos devido ao conflito na área de fronteira; outros ficaram presos há um ano quando a fronteira foi fechada devido à COVID-19.

“Quando minha esposa e eu deixamos a Etiópia, planejávamos ir para a Arábia Saudita e melhorar nossa condição financeira”, disse Hussein Awal, de 21 anos. “No momento, estamos presos em Marib, procurando uma maneira de sustento. Se eu não conseguir trabalho, não posso me alimentar ou a minha esposa. Somos quatro agora, depois que minha esposa deu à luz gêmeos, então, sinto que estou com um grande problema quando penso em sustentar todos eles.”

Como Hussein e sua esposa, a maioria dos migrantes em Marib vive em condições de superlotação, com saneamento precário e acesso limitado a serviços básicos. Os temores em torno da disseminação da COVID-19 aumentaram o risco de serem estigmatizados, presos e detidos. Seus movimentos são frequentemente restritos e eles têm poucas oportunidades de trabalho. Os combates em curso em Marib só irão agravar essas vulnerabilidades e piorar o que já está precário.

A equipe móvel de MSF também oferece assistência médica em Hareeb Junction, uma favela nos arredores da cidade de Marib, onde vive a comunidade Al-Muhamasheen – “os marginalizados” – um grupo minoritário que sofre discriminação, pobreza e exclusão social e geralmente são de origem africana. Como a maioria das áreas onde vivem membros da comunidade Al-Muhamasheen, Hareeb Junction não tem água encanada, saneamento adequado ou coleta de lixo. Seus residentes têm poucas oportunidades econômicas e recebem assistência muito limitada de agências de ajuda humanitária.

“Costumávamos nos sentir seguros em nossas casas e não sabíamos o significado da miséria, mas é o que vivemos agora com a falta de serviços básicos”, diz Zabeidi Rashid, de 60 anos, que mora em Hareeb Junction. “Somos como pássaros que vão em busca de comida para alimentar seus filhos: se eles não saírem em busca de comida, seus filhos não comerão.”

Zabeidi foi deslocado de sua casa em outro lugar, onde vivia uma vida relativamente melhor. “Não consigo controlar meus sentimentos sempre que me lembro de como costumávamos viver no passado”, diz ele, com os olhos cheios de lágrimas. “Se você pudesse ver a bela casa onde eu morava, não acreditaria que eu morava lá.”

Com as famílias em Hareeb Junction tendo em média cinco filhos cada, a maioria da população é composta de crianças. Sem escola na região, elas não recebem educação e seus pais não podem comprar sapatos, fraldas ou roupas. Se elas ficam doentes, não há dinheiro para levá-las ao médico.

Os serviços médicos de MSF são gratuitos, portanto, quando a equipe móvel chega, é sempre recebida por uma fila de pessoas esperando por uma consulta. Uma das condições médicas mais comuns é a diarreia, relacionada ao saneamento básico precário da área e à falta de água potável.

Percebendo que algumas das crianças passaram por eventos traumáticos relacionados aos seis anos de guerra e deslocamento, a equipe de MSF organiza atividades recreativas, como sessões de sorteio e jogos de futebol. Esses jogos desempenham um papel importante em seu desenvolvimento, afirma a gerente de atividades de saúde mental de MSF, Lisa La Gattuta. “Essas atividades são muito importantes para as equipes de MSF se envolverem com a comunidade, mas, acima de tudo, para promover a interação social e o desenvolvimento mental”, diz ela.

 

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