HIV/Aids: 20 anos de cuidados gratuitos na RDC

Apesar dos progressos alcançados por MSF, muitos desafios permanecem no país.

Michel Lunanga/MSF

Em 2002, Médicos Sem Fronteiras (MSF) abriu o primeiro centro de tratamento ambulatorial que oferece atendimento gratuito a pessoas vivendo com HIV em Kinshasa, capital da República Democrática do Congo (RDC). Vinte anos depois, enquanto grandes progressos foram alcançados no país, enormes lacunas permanecem em testes e tratamento, causando milhares de mortes evitáveis a cada ano.

As últimas duas décadas foram marcadas por uma luta constante para tornar o tratamento antirretroviral (TARV) disponível e acessível a todos, gerar mudanças na legislação e na consciência pública, melhorar a qualidade dos cuidados na capital e em todo o país, denunciar lacunas de acesso ao tratamento e pressionar os parceiros nacionais e internacionais a aumentar os recursos necessários para enfrentar os enormes desafios impostos pelo HIV/Aids na RDC.

Apesar dos consideráveis sucessos para os quais MSF contribuiu com outros atores, o progresso na RDC continua lento e frágil. Grandes problemas permanecem para tornar o HIV/Aids uma pandemia do passado. De acordo com os últimos números disponíveis do Programa Conjunto das Nações Unidas sobre o HIV/Aids (UNAIDS), mais de 500 mil pessoas vivem com HIV na RDC hoje, e uma em cada cinco pessoas ainda não tem acesso ao tratamento. Em 2021, o HIV/Aids foi responsável por quase 14 mil mortes e cerca de 20 mil pessoas passaram a viver com o vírus.

Para MSF, a mobilização continua, hoje, como no passado. Veja nossa linha do tempo:

Foto: Tommy Trenchard/Panos Pictures

2002: MSF abre o primeiro centro gratuito de tratamento de HIV em Kinshasa

Em maio de 2002, MSF inaugura o primeiro centro de tratamento ambulatorial gratuito para tratamento de HIV/Aids em Kinshasa. Localizado na avenida Kabinda, o centro também oferece teste de HIV gratuito para todos. À época, o tratamento antirretroviral (TARV) é raro e extremamente caro no país, deixando as pessoas que vivem com o HIV em uma situação catastrófica.

2003: MSF introduz tratamento antirretroviral gratuito para seus pacientes

O custo do tratamento com TARV diminui, mas ainda excede US$ 40 por mês (aproximadamente 211 reais). MSF começa a fornecer tratamento ARV gratuito para seus pacientes em Kinshasa e Bukavu.

Foto: Tommy Trenchard/Panos Pictures

2004: MSF apoia a criação de uma rede de pessoas que vivem com HIV

Para reforçar a adesão dos pacientes ao tratamento e ajudá-los a lutar por seus direitos, MSF ajuda grupos de apoio a estabelecer sua primeira associação, que mais tarde se tornará a rede nacional de organizações de pessoas vivendo com HIV. De 10 membros em 2004, esta rede tem agora mais de 15 mil membros e ativistas em 13 das 26 províncias da RDC.

2005: MSF descentraliza o atendimento ao HIV para outras instalações

Apenas dois anos após a abertura do centro de tratamento de MSF em Kinshasa, cerca de três mil pacientes são acompanhados, dos quais mais de 1.400 estão recebendo TARV gratuito. No entanto, o acesso aos cuidados de HIV e ao ARV fora do centro de MSF permanece escasso, e a organização decide descentralizar os serviços oferecidos para três outros centros de saúde em Kinshasa. Para aumentar o acesso ao tratamento, MSF propõe e implementa um novo modelo de atendimento nos três centros de saúde: a prescrição de TARV por enfermeiros, também encarregados do acompanhamento dos pacientes. Essa abordagem fornece rapidamente bons resultados: 750 pacientes adicionais têm acesso rápido a TARVs nesses três centros de saúde. Em setembro de 2005, MSF também inicia os cuidados de HIV/Aids para crianças no centro de tratamento ambulatorial de Kabinda. Nesse ano, 82 crianças recebem TARVs.

Foto: – Tommy Trenchard/Panos Pictures

2006: MSF fornece serviços específicos de HIV e Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs) para profissionais do sexo

De 2006 a 2010, MSF administra o centro ‘Biso Na Biso’ (‘Entre nós’, em Lingala, um dos idiomas oficiais na RDC) na comuna de Masina, em Kinshasa. A instalação oferece serviços de prevenção, diagnóstico e tratamento para HIV e ISTs, para profissionais do sexo, seus clientes e seus filhos. Mais de 200 pessoas têm seu tratamento antirretroviral iniciado pelo centro.

2008: MSF abre uma unidade de internação para HIV avançado

Seis anos após a abertura do centro de tratamento ambulatorial de MSF, nossas equipes abrem uma unidade de internação para fornecer atendimento gratuito para pacientes com HIV avançado. Inaugurado em maio de 2008, o Centro Hospitalar de Kabinda (CHK) tem uma capacidade inicial de 24 leitos, incluindo quatro leitos para pacientes coinfectados com tuberculose que devem ser tratados em unidades isoladas.

Foto: Kris Pannecoucke

2009: MSF introduz um novo sistema de distribuição de tratamento antirretroviral

A fim de facilitar a adesão ao tratamento do HIV, MSF introduz um novo sistema de distribuição de medicamentos na RDC: o esquema de recarga de três meses do TARV. A cada três meses, pacientes estáveis recebem seu estoque de medicamentos para o próximo trimestre. Esta estratégia de distribuição reduz as viagens do paciente e os custos de transporte, enquanto diminui o congestionamento nas instalações de saúde.

2010: MSF inicia postos comunitários para distribuição de tratamento antirretroviral

Para aumentar ainda mais o acesso ao tratamento, MSF começa a implementar abordagens baseadas na comunidade na distribuição de tratamento antirretroviral. Com a rede nacional de HIV, nossas equipes montaram os primeiros postos de distribuição comunitárias de TARV nos distritos de Masina e Ngaliema, em Kinshasa.

Foto: Pablo Garrigos/MSF

2012: MSF expande o atendimento ao HIV e denuncia a falta de financiamento

Dado o número crescente de pacientes que precisam de cuidados com o HIV em Kinshasa, as equipes de MSF aumentam a capacidade de leitos no Centro Hospitalar Kabinda (CHK) e estendem seu apoio médico a oito centros de saúde extras e dois hospitais. Naquele ano, MSF também introduz o teste de carga viral de rotina no CHK, um diagnóstico importante para avaliar a evolução da infecção e a eficácia do tratamento. A organização denuncia publicamente a falta de recursos fornecidos pelo país e seus parceiros internacionais para combater a epidemia. As equipes de MSF na RDC pedem ao governo e aos doadores que ampliem seus esforços para aumentar a cobertura antirretroviral.

Foto: Kris Pannecoucke

2013: MSF inicia cursos de treinamento clínico e apoia a profissionais

Equipes de MSF na RDC iniciam cursos de treinamento clínico para médicos e enfermeiros sobre HIV e tuberculose avançados. Desde 2013, 145 profissionais de saúde participaram dessa formação. MSF também começa a treinar conselheiros de profissionais no CHK e em outras instalações apoiadas, a fim de fornecer apoio psicossocial aos pacientes e fortalecer sua adesão ao tratamento.

2015: MSF aumenta a capacidade de leitos e destaca lacunas no tratamento

Em Goma, província de Kivu do Norte, MSF lança um novo projeto para fornecer cuidados e tratamento às pessoas que vivem com HIV. Em Kinshasa, a alarmante taxa de ocupação de leitos (mais de 120 por cento) nos obriga a aumentar a capacidade para 42 leitos.

Foto: Sara Creta/MSF

2017: MSF alerta para a falta de financiamento para o HIV avançado e campanhas contra o estigma

Um relatório de MSF alerta sobre a falta de financiamento disponível no país para tratar pacientes com HIV avançado. Naquele ano, de acordo com números oficiais: 11% das pessoas precisavam ser acamadas já na primeira consulta. Apenas uma em cada duas pessoas que vivem com HIV na RDC sabe sobre sua condição. Apenas 38% das pessoas que vivem com HIV têm acesso a ARTs.
Nos esforços empreendidos para combater a enorme estigmatização contra as pessoas vivendo com HIV na RDC, MSF colabora com uma associação de jovens vivendo com HIV e dois artistas congoleses famosos para produzir o videoclipe “Zwa Nga Bien” (“Olhe bem para mim”) e lançar uma campanha massiva de conscientização na mídia e nas redes sociais.

Foto: Tommy Trenchard/Panos Pictures

2018: MSF aumenta o acesso ao diagnóstico precoce de carga viral para recém-nascidos

Apenas um quarto das pessoas que vivem com HIV e que são elegíveis para o diagnóstico de carga viral tem acesso a ele. MSF, em colaboração com o Fundo Global, decide expandir o acesso ao teste de carga viral e ao diagnóstico precoce para recém-nascidos de mães que vivem com HIV em 14 zonas de saúde em Kinshasa. Entre março e dezembro, a cobertura de carga viral nas zonas de saúde-alvo aumenta de 5% para 53%. Este modelo passa a ser replicado por outros parceiros.

2019: MSF implementa grupos de apoio entre jovens que vivem com HIV

No CHK, MSF implementa uma nova iniciativa: grupos de apoio para pacientes jovens que vivem com HIV. Esses grupos oferecem aos pacientes de 14 a 25 anos um espaço onde eles podem se apoiar, ajudar a superar os desafios do estigma e aumentar sua adesão ao tratamento.

Foto: MSF/Charly Kasereka

Como estamos atualmente?

Atualmente, MSF está apoiando o Ministério da Saúde congolês na prestação de cuidados gratuitos para milhares de pacientes que vivem com HIV em Kinshasa e em seis províncias: Kivu do Norte, Kivu do Sul, Maniema, Ituri, Kasai Oriental e Kongo Central. Além do apoio médico fornecido em Kinshasa e em todo o país, as equipes de MSF continuam defendendo uma resposta mais robusta ao HIV, na medida que os desafios permanecem enormes, apesar do progresso obtido ao longo dos anos.

 

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