Falta de medicamentos de aids para crianças: uma questão de vida ou morte

MSF apela à OMS e à UNICEF para que cobrem das indústrias farmacêuticas e dos governos maior empenho para o desenvolvimento de formulações pediátricas de medicamentos para aids. 50% das crianças portadoras do HIV morrem antes dos dois anos de idade.

Crianças portadoras do HIV/aids estão morrendo desnecessariamente por causa da falta de medicamentos adequados e adaptados. Um dia antes da abertura de um encontro sobre formulações pediátricas para o tratamento da aids em crianças, organizado pela Organização Mundial de Saúde e pela UNICEF em Genebra, MSF apresentou experiências que revelam que o tratamento de crianças portadoras do HIV/aids é muito mais caro e complicado que o tratamento de adultos.

Formas simplificadas para tratar o HIV/aids em adultos se tornaram disponíveis aos pacientes dos países em desenvolvimento durante este ano. A maioria dos pacientes adultos em países em desenvolvimento ou está tomando uma combinação fixa de três medicamentos ou uma combinação fixa de dois medicamentos mais um terceiro anti-retroviral (1).

No entanto, nenhuma das duas combinações está disponível em formulações pediátricas. Quando as doses pediátricas são disponibilizadas, elas vêm custando muito caro. O tratamento para crianças nos países mais pobres do mundo pode custar seis vezes mais que o tratamento para adulto – US$1.300 contra US$200 por ano (2).

“Como as indústrias não desenvolvem combinações triplas de anti-retrovirais fáceis de usar para crianças, eu faço o que a maioria dos médicos está fazendo: tento mostrar aos adultos que cuidam dessas crianças como partir e dividir comprimidos para adultos, na esperança de que as crianças tenham acesso às doses que necessitam”, disse Dr Koen Frederix, um pediatra que trabalha para MSF no Malawi. “Crianças pequenas não conseguem engolir comprimidos, por isso precisam tomar xaropes em diferentes quantidades, o que complica o tratamento”.

Em países ricos um número relativamente pequeno de crianças está nascendo com HIV, enquanto que em países em desenvolvimento, onde as crianças continuam nascendo com HIV, as pessoas são pobres e não representam um mercado atrativo. Conseqüentemente, as indústrias farmacêuticas têm pouco interesse em desenvolver ou comercializar formulações pediátricas adaptadas para os países mais pobres, como as combinações de doses fixas ou comprimidos mastigáveis ou fáceis de partir.

A única esperança no horizonte está na possibilidade de algumas indústrias virem a decidir desenvolver combinações de doses fixas ou formulações adaptadas para crianças (3). Alguns estudos em andamento estão buscando um tratamento para crianças que resultaria na administração de um único comprimido por dia. No entanto, sem a possibilidade de um mercado lucrativo, as indústrias não estão alocando recursos suficientes para alcançar resultados rápidos neste campo.

MSF apela à OMS, UNICEF e aos governos que documentem a extensão desta crise e liderem esta luta para que possamos superar esta falta de um mercado para medicamentos de aids para crianças.

“A OMS e a UNICEF, a agência da ONU responsável pelas questões relacionadas à infância, deveriam fazer o alerta”, disse David Berman, coordenador de HIV/Aids para a Campanha de Acesso a Medicamentos Essenciais de MSF. “Esta semana, os especialistas estarão se reunindo para identificar as falhas. Mas para que haja realmente um impacto, as organizações internacionais e os programas nacionais precisarão trabalhar ativamente com governos e indústrias farmacêuticas para que o problema da falta de interesse comercial de anti-retrovirais para crianças possa ser superado”.

MSF começou a tratar crianças portadoras do HIV/aids com anti-retrovirais em dezembro de 2000. Em meados de 2004, cerca de 5% dos pacientes de MSF sob tratamento com anti-retrovirais eram crianças com menos de 13 anos de idade. MSF está comprometida em fazer o melhor para as crianças, mas os esforços dos nossos médicos estão sendo frustrados pela falta de instrumentos adequados.

As equipes de MSF criaram instrumentos alternativos para ajudar os profissionais de saúde a prescreverem anti-retrovirais e garantirem a adesão em crianças, como diários de saúde, calendários de tratamento, e contos de fadas sobre “Devimmon”, uma bruxa que serve como metáfora para o HIV, numa tentativa de ajudar as crianças a compreenderem e aderirem ao tratamento.

As estimativas mundiais do número de crianças portadoras do HIV/aids eram de 2.5 milhões em 2003. No mesmo ano, 700.000 crianças com menos de 15 anos de idade foram infectadas pelo HIV. 88,6% delas vivem em países da África sub-saariana. 50% das crianças portadoras do HIV/aids morrem antes dos dois anos de idade.

1 – O Brasil não utiliza, no seu Programa Nacional de DST/aids, as combinações fixas contendo três medicamentos em um, mas existe a utilização de dois em um mais um terceiro anti-retroviral.
2 – No Brasil uma terapia com três medicamentos produzidos localmente custa aproximadamente US$ 600,00 por ano/paciente.
3 – Há uma projeção de que várias empresas públicas e privadas estão finalizando algum tipo de combinações de dose fixa. No entanto, não há notícia de nenhuma empresa brasileira que esteja desenvolvendo formulações pediátricas que poderiam ser exportadas.

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