“Ainda estamos aqui”: a batalha contra o Ebola em Serra Leoa continua

Administradora brasileira trabalha em centro de tratamento de MSF pela segunda vez

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Enquanto se comemora o fim da epidemia de Ebola na Libéria, a organização humanitária internacional Médicos Sem Fronteiras (MSF) continua atuando em diversas frentes para combater a doença em Serra Leoa. No país, Mariana Rossi, administradora brasileira, é parte da equipe de coordenação de um centro de tratamento de Ebola, especializado em maternidade, localizado nos arredores de Freetown. Pela segunda vez no mesmo projeto, ela tinha esperanças de encerrar sua participação no momento do fechamento do próprio centro de tratamento e da tão esperada declaração de que Serra Leoa estivesse, também, livre da doença. Isso ainda não aconteceu, e, como conta Mariana, a batalha continua.

Presenciar o encerramento do projeto de MSF em Freetown seria como fechar um ciclo para Mariana, que esteve ali durante sua estruturação e inauguração. “Quando cheguei, no final de dezembro de 2014, não havia sequer uma caneta”, conta. “Em quatro semanas, a equipe trabalhando ali já chegava a 200 pessoas. Foram muitos testes e entrevistas para recrutar todos os profissionais da maneira mais transparente possível. Em um só dia, chegamos a contratar 30 higienistas, aqueles que cuidam de desinfetar com cloro todas as alas do centro de tratamento para impedir a contaminação do local pelo Ebola. Cheguei ao ponto de trabalhar 15 horas por dia!” O número de casos da doença passou a se reduzir em janeiro, chegando a estabilizar próximo do final do mês, o que levou a administradora a pensar que teria mesmo de planejar o fim do projeto. “Tivemos que nos preparar e começar a implementar a dispensa de parte das pessoas que estavam trabalhando. Na primeira onda de demissões, foram 36 pessoas e nunca é fácil”. Ela explica que, para evitar desconfortos e os desligamentos acontecerem da forma mais leve possível, foi pensado um pacote de benefícios para os funcionários locais, que envolvia, além de aviso prévio, indenização de risco, um certificado e uma camiseta de agradecimento, que trazia estampadas as mãos de um sobrevivente.

Para Mariana, seu primeiro contato com o Ebola não envolveu paranoias. “Quando você decide ir, o momento é de ousadia. Há o medo do desconhecido, mas não houve pânico. Além de eu não ter função na área de risco, por não ser da área da saúde, as regras de segurança sempre me confortaram. Pânico não ajuda”, conta. Ela, inclusive, identificou em si mesma a capacidade de lidar com essa emergência. “Claro que você cria uma defesa, se protege, mas aquilo não pode te imobilizar; é preciso reagir”, diz ela, que atuou com MSF por um ano na República Centro-Africana, onde pôde atestar, pela primeira vez, sua habilidade de reação em meio à insegurança e ao medo.

No início de março, Mariana encerrou sua primeira participação no centro de tratamento, mas não voltou ao Brasil. Depois de um treinamento feito em Genebra, ela voltou a Serra Leoa para ocupar a posição de Coordenadora de Recursos Humanos por outros três meses. Um dos desafios tem sido o de fazer a gestão da equipe internacional de MSF, cuja rotatividade é alta, já que os profissionais que trabalham na área de alto risco permanecem, no máximo, seis semanas no projeto. Para a administradora, foi uma alegria poder voltar ao projeto, podendo já aplicar os conceitos aprendidos e implementar algumas mudanças, que já passam por sua cabeça: “A gente responde à necessidade imediatamente, por vezes, sem uma estratégia robusta que envolva todos os aspectos. Não dá tempo. Quero estruturar um processo que nos permita antecipar as necessidades e preparar os profissionais para um projeto como esse, para atingirmos os objetivos com o máximo de efetividade”, conta.

Atualmente, segue havendo uma oscilação no número de casos e é difícil prever quando o país estará, enfim, livre do Ebola. A partir daí, o desafio será a restruturação do sistema de saúde de Serra Leoa – que já era frágil antes da epidemia –, uma tarefa na qual MSF também participará. “O mundo já não ouve falar muito do Ebola, mas nós ainda estamos aqui – e aqui seguiremos enquanto for necessário”, conclui Mariana Rossi.

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