Pacientes de Ebola em estado grave se recuperam em Serra Leoa

Médica relata a liberação de dois pacientes em estado grave e detalha a união das mulheres no centro de tratamento de MSF

serra_leoa-msf-monica-ebola

Por Monica Arend-Trujillo, médica de MSF em Bo, Serra Leoa

“Ontem foi um dia de grande alegria – dois de nossos pacientes extremamente doentes foram liberados e uma bebê sobreviveu, contrariando todas as possibilidades.

Quando Hassan foi internado, estava praticamente morto. Não podia se mover nem falar. Tinha diarreia constante, estava confuso, desorientado e letárgico. Os enfermeiros foram sensacionais. Eles passavam cerca de meia hora por vez com ele, tentado alimentá-lo e dando-lhe água. Então, um dia, quando entrei na área de alto risco, ele estava falando novamente. No dia seguinte, ele estava sentado em sua cama e me disse: ‘Amanhã, vou andar”. No dia seguinte, ele caminhou do lado de fora até a área onde ficam os pacientes em recuperação. Eu mal podia acreditar na transformação; até seu rosto estava mudado. No dia seguinte, ele estava cercado por um grupo de amigos e jogava cartas.

O amigo mais próximo de Hassan no centro de tratamento era Mohamed, o segundo paciente mais doente que eu havia visto até então. Uma noite, Mohamed ficou nervoso e confuso. Geralmente, é um sinal muito ruim quando as pessoas começam a desenvolver problemas mentais. Ele estava ameaçando outros pacientes, que começaram a entrar em pânico e correr pelos corredores, na tentativa de fugir dele.

Em um dado momento, um higienista e um especialista em água e saneamento o convenceram a tomar um medicamento antipsicótico, que o derrubou. Quando Mohamed acordou, estava novamente calmo, e, dali para frente, foi ganhando cada vez mais força. Ele se sentou com Hassan do lado de fora, e ficaram os dois jogando cartas, fazendo piadas e comentando o quanto se sentiam saudáveis. E ontem os dois foram liberados e partiram para Moyamba.

Nós também demos alta à sobrinha de 10 meses de Hassan, Kumba. A bebê chegou com a mãe, que estava com Ebola, em uma ambulância cheia de pacientes com a doença. Apesar disso, e apesar de ter sido amamentada, ela testou negativo. Colocamos Kumba em um cubículo separado dos demais pacientes, mas logo ela apresentou febre e passamos a tratá-la com antibióticos. Ao retestá-la após uma semana, descobrimos que ela ainda estava negativa, e, por isso, foi liberada para ir para casa com seu tio. A mãe de Kumba será testada hoje, e tenho certeza de que o resultado será negativo também. 

Um grande número de pacientes estão quase recuperados – esperam apenas um último teste com resultado negativo – e, por isso, o ambiente na área de alto risco é bastante positivo.

Algumas das mulheres formaram um grupo e se tornaram amigas. Elas tomam banho juntas, contam piadas, correm pelos corredores para se exercitarem, dançam juntas. Dancei com elas mesmo com minhas vestimentas de proteção.

As mulheres prestam suporte umas às outras. Quando pacientes de Ebola começam a se recuperar, ficam extremamente famintos – três refeições não são suficientes. Uma mulher pediu a sua família para trazer comida, e compartilhou com as outras. Outra mulher estava muito fraca; ela vomitava e tinha diarreia, mas o principal problema foi depressão. Sua mãe e sua tia haviam morrido e, ao todo, ela tinha perdido 17 membros de sua grande família. Nunca a tinha visto sorrindo e ela não queria falar. Mas, agora, ela é parte do grupo e está conversando e cantando com as outras.”

Os nomes dos pacientes foram alterados.
 

Compartilhar
Share on facebook
Share on twitter
Share on linkedin
Share on whatsapp
Share on print