Medidas enérgicas precisam ser tomadas para o controle da febre de Marburg em Angola

MSF alerta as autoridades angolanas para que façam uma campanha de conscientização junto à população local e aos profissionais de saúde para evitar que o vírus de Marburg se espalhe por todo o país. Dos 257 casos registrados, 235 já morreram

A febre hemorrágica de Marburg – semelhante ao Ebola – continua se espalhando pela província angolana de Uige. Até o momento, o número oficial de mortos chega a 235 pessoas, e os casos registrados já somam 257. Testes biológicos realizados pela OMS – Organização Mundial de Saúde – confirmaram a presença do vírus no dia 22 de março de 2005. Desde então, 114 novos casos foram identificados, sendo que destes, 107 já morreram.

Apesar desta estatística alarmante, as medidas anunciadas para o controle da epidemia não vêm sendo suficientes e não conseguiram impedir que a epidemia se espalhasse. Enquanto o epicentro do surto está em Uige, na semana passada surgiram novas áreas de infecção. Em Songo, a oeste de Uige, quatro casos foram registrados. E em Negage, a sudoeste de Uige, já são três os casos identificados. As infra-estruturas de saúde dessas duas localidades já foram afetadas.

Combatendo uma doença contagiosa e fatal e uma epidemia complexa

A febre de Marburg é uma doença fatal e contagiosa. O controle da doença exige uma estratégia rigorosa e multi-setorial.

Como a febre de Marburg pode ser transmitida por meio do contato direto com os fluidos corporais, é fundamental que se construa unidades de isolamento para tratar as pessoas afetadas. Não existe nenhum tratamento específico, mas algumas medidas devem ser tomadas para tratar aqueles que já estão doentes (re-hidratação, administração de medicamentos que evitem que a pessoa vomite, etc).

Desde o início da crise nossas equipes já montaram duas unidades de isolamento: uma no hospital de Uige e outra no hospital Américo Boavida, na capital, Luanda. Até agora, 23 pacientes já foram recebidos na unidade de Uige. Unidades de isolamento também estão sendo criadas em Negage e em Songo, enquanto a unidade em Camabatela acaba de ficar pronta.

Informação à população

Para reduzir o risco de infecção, esforços precisam ser feitos no sentido de identificar os casos suspeitos e localizar as pessoas que possam ter tido contato com aquelas afetadas pelo vírus. Cerca de 500 pessoas já foram identificadas em Angola – 360 destas em Uige. Além disso, procedimentos sanitários devem ser adotados durante o enterro das vítimas da febre de Marburg – independente se as mortes ocorreram em casa ou nos hospitais.

Essas prioridades exigem um importante esforço logístico e humano. Roupas protetoras (luvas, gorros, máscaras, óculos, botas, etc) são essenciais, assim como veículos devem ser providenciados para que se possa localizar os casos suspeitos nas diferentes regiões do país, e para transportar os pacientes e os corpos. Todos os profissionais, de saúde ou não, devem ser notificados imediatamente.

Nossos profissionais estão treinando os profissionais de saúde e o pessoal militar em Angola, alertando-os sobre as precauções sanitárias que devem ser adotadas para que seja reforçada sua própria segurança caso eles entrem em contato com vítimas ou com corpos de vítimas. Esses esforços devem ser intensificados.

Essas medidas devem ser acompanhadas de políticas específicas que visem a informação da população local. Até agora muito pouco foi feito para alertar a população angolana, e, num clima de medo, as equipes de MSF e os profissionais da OMS vêm sendo tratados com hostilidade durante as visitas às áreas de Cadongo e Kimakongo, em Uige. Como o controle da epidemia exige isolar pacientes e enterrar as vítimas em sacolas, a população local identifica, com freqüência, os profissionais de ajuda humanitária como pessoas que 'confiscam' os doentes e os mortos.

Além disso, o alto índice de mortalidade dos pacientes que deram entrada nas unidades de isolamento (apenas dois sobreviveram por mais de 24 horas) vem criando um clima de desconfiança entre a população local. Como conseqüência, os moradores muitas vezes se recusam a entregar as pessoas doentes e os mortos aos profissionais de saúde, preferindo mantê-los em casa, aumentando o risco de contaminações futuras.

Ao informar a população e evitar o pânico, as pessoas que mostrarem os primeiros sintomas da doença poderão ser hospitalizadas com antecedência, o que poderá levar a uma redução do índice de mortalidade.

Reorganizando os hospitais afetados

Os hospitais afetados pelo vírus de Marburg devem ser completamente reorganizados para evitar qualquer risco de o vírus se espalhar pelo hospital. Todos os equipamentos devem ser desinfetados e uma unidade de isolamento deve ser criada.

A triagem de pacientes deve ser iniciada para que os casos suspeitos sejam isolados e para se evitar que as pessoas infectadas pelo vírus mantenham contato com pacientes de outras doenças.

Essas medidas de precauções devem ser adotadas em todo o hospital. Isto envolve não apenas vestir os equipamentos de segurança, mas também suspender todos os procedimentos externos (cirurgias, inspeções de laboratórios e injeções intramusculares, etc) com exceção daqueles de extrema necessidade (tais como operações de emergência, cesarianas, etc) que devem ser realizados de acordo com os procedimentos sanitários.

Reação inadequada

No momento, os esforços nacionais e internacionais permanecem, na maioria das vezes, inadequados diante da gravidade da situação. É fundamental que as autoridades angolanas tenham consciência da extensão da epidemia.

Sem um tratamento apropriado e sem uma adequada proteção da população, a febre hemorrágica de Marburg continuará se espalhando por toda Angola.

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