Acesso a medicamentos não é estável nos países mais afetados pelo HIV/Aids

A escassez de antirretrovirais precisa ser urgentemente respondida para permitir a aceleração da luta contra o HIV/Aids

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A organização humanitária internacional Médicos Sem Fronteiras (MSF) alertou hoje (27/11) que os medicamentos antirretrovirais (ARVs) não estão chegando às pessoas que vivem com HIV/Aids na África subsaariana, apesar de alguns países já terem estoque suficiente, e faz um apelo por melhorias urgentes nas cadeias de suprimento da região.

Um novo relatório de MSF que será publicado na Conferência Internacional de Aids e DSTs na África (Icasa, na sigla em inglês) “Empty Shelves, Come Back Tomorrow –ARV Stock Outs Undermine Efforts to Fight HIV” (“Prateleiras Vazias, Volte Amanhã – Escassez de ARVs Ameaça Esforços na Luta Contra o HIV”, na tradução livre para o português) é baseado em pesquisas conduzidas na África do Sul, em Moçambique, no Malauí e na República Democrática do Congo (RDC). Ele mostra que faltam medicamentos na maioria dos estoques por causa da falta de habilidade das cadeias de suprimento de ARVs para assegurar uma entrega eficiente na etapa final: os medicamentos necessários estão disponíveis no país, mas não chegam às clínicas periféricas devido a procedimentos complexos, desafios logísticos e falta de recursos.

“Nós não podemos consertar o que não enxergamos. A maior parte dos esgotamentos de estoque acontece em silêncio, e as pessoas vão para casa de mãos vazias ou com tratamentos subaproveitados. A falta nacional e internacional de medicamentos atrai a atenção de doares e governos, mas a disponibilidade de medicamentos em centros de saúde locais não é monitorada habitualmente e, portanto, nada é feito, mesmo que as ocorrências sejam regulares e afetem um grande número de pessoas”, diz Tinne Gils, farmacêutica regional de MSF.

Pesquisas nacionais conduzidas por dois anos consecutivos na África do Sul mostram que entre 20 e 25% dos centros de saúde locais não foram capazes de repassar a quantidade completa de um ou mais medicamentos de HIV ou tuberculose (TB). Em 80% dos casos, os medicamentos estavam disponíveis no país, mas não chegavam às farmácias das clínicas. Em Kinshasa, na RDC, 77% dos centros de saúde da cidade que participaram da pesquisa enfrentaram a falta de pelo menos um ARV em seus estoques em um período de três meses, enquanto em Moçambique 41% das 17 clínicas pesquisadas na cidade de Maputo e na província rural de Tete também passaram pelo mesmo problema.

O Malauí é o único caso onde os ARVs conseguem chegar regularmente até seu destino final, demonstrando que isso pode ser alcançado mesmo em um contexto de recursos precários. No entanto, assim como os três países pesquisados, o Malauí sofre periodicamente com a escassez de estoque aguda devido a mudanças nos regimes de tratamento padrão ou ao aumento da demanda por medicamentos específicos.

O relatório mostra que promover melhorias na entrega completa de medicamentos precisará de comprometimento de longo prazo de países e doadores internacionais, mas o documento também detalha simples medidas emergenciais que podem reduzir rapidamente o impacto do esgotamento de estoques sobre as pessoas. Por exemplo, as pessoas vivendo com HIV na África do Sul e em Moçambique começaram a desempenhar um papel no monitoramento da disponibilidade de medicamentos em nível clínico, alertando governos centrais sobre o esgotamento do estoque.

“O sistema precisa ser melhorado porque nós não podemos lutar contra o HIV sem medicamentos. Para proteger de modo eficiente a saúde dos indivíduos e reduzir a transmissão do HIV em comunidades, o tratamento antirretroviral precisa ser feito ao longo da vida, sem interrupção. Mas como esperar que as pessoas continuem firmes em seus tratamentos se seus medicamentos não estão disponíveis quando e onde elas precisam?”, diz o Dr. Gilles Van Cutsem, coordenador médico de MSF na África do Sul. “Fazer a cadeia de suprimentos funcionar até a última etapa e mensurar o acesso são pré-condições para os países estarem aptos a controlar o surgimento de resistência ao atual tratamento antirretroviral, acelerar a luta contra o HIV e controlar a epidemia.”

Na África do Sul, os dados do relatório foram coletados em colaboração com a sociedade civil e baseados em uma grande amostra nacional de clínicas por dois anos consecutivos. Em Moçambique, no Malauí e na RDC, foram realizadas pesquisas instantâneas em colaboração com governos.

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