Programa de saúde mental beneficia iraquianos

MSF divulga novo relatório sobre a necessidade de acesso da população a serviços de saúde mental

Décadas de conflitos, instabilidade política e agitações sociais deixaram muitos iraquianos vulneráveis a estresse psicológico, perturbações mentais, e em necessidade de cuidados voltados para a saúde mental, afirma a organização humanitária internacional Médicos Sem Fronteiras (MSF) em relatório lançado hoje em Bagdá.

O novo relatório de MSF “Healing Iraqis: The Challenges of Providing Mental Health Care in Iraq” (“Os desafios de oferecer cuidados de saúde mental no Iraque”, em português) revela o impacto da violência cotidiana em muitos homens, mulheres e crianças e descreve o desenvolvimento de um programa para a oferta de aconselhamento, em parceria com o Ministério da Saúde.

A organização afirma que há uma necessidade urgente de intensificação dos serviços de saúde mental no país. MSF pede que o Ministério da Saúde iraquiano e seus parceiros melhorem a qualidade e o acesso a serviços de saúde mental por meio da integração de consultas de aconselhamento aos serviços oferecidos nas instalações de saúde já existentes por todo o Iraque. MSF também pontua que é preciso fazer mais para reduzir o estigma acerca da saúde mental, com o objetivo de estimular as pessoas a procurarem aconselhamento.

Desde 2009, MSF atua no Iraque levando aconselhamento voltado para a saúde mental a homens, mulheres e crianças, juntamente com o Ministério da Saúde nacional. Os programas de MSF têm abordagens não farmacêuticas de resposta à ansiedade e à depressão, condições frequentemente vivenciadas por pessoas expostas à violência e à incerteza.

“Muitos iraquianos chegaram ao seu limite absoluto, à medida que décadas de conflito e instabilidade causaram devastação. Devido a experiências que os levaram à exaustão mental, muitos iraquianos batalham para entender o que está acontecendo com eles; as sensações de isolamento e desesperança são agravadas pelo tabu associado à questão de saúde mental e à falta de serviços de saúde mental aos quais as pessoas possam recorrer”, afirma Helen O´Neill, coordenadora geral de MSF no Iraque.
 
Nos últimos quatro anos, MSF e o Ministério da Saúde iraquiano introduziram serviços de aconselhamento psicológico em dois hospitais de Bagdá e em um em Fallujah. Há planos para implementar a iniciativa como modelo, para que possa ser replicada em outras instalações de saúde do país utilizando as novas estruturas do próprio Ministério nos hospitais de Kut, Karbala e Sulaymaniyah. MSF também recomenda que o sistema de saúde iraquiano integre o aconselhamento psicológico aos serviços de saúde primários comunitários para ampliar o acesso aos cuidados, principalmente entre mulheres e crianças.

De acordo com informações coletadas em 2012 por MSF e pelo Ministério da Saúde do Iraque, 97% das pessoas que se apresentaram para sessões de aconselhamento apresentaram sintomas psicológicos clinicamente significativos no momento da admissão. Quando mensurados na última visita, os resultados referentes ao mesmo quadro foram reduzidos para 29%.

Ainda que os casos de conflitos domésticos sejam excluídos, cerca de metade de todos os casos atendidos pelo programa (48%) estavam relacionados à violência. Quase todos os pacientes e profissionais do programa de saúde mental de MSF vivenciaram ou conhecem alguém próximo que tenha sido impactado diretamente por um evento violento nos últimos anos.

O relatório traz testemunhos de iraquianos traumatizados e batalhando para reconstruir suas vidas após terem testemunhado violência extrema.

Uma viúva de 36 anos, mão de três crianças, descreve como começou as sessões de aconselhamento após ter tido a vida virada do avesso com a morte de seu marido, dois anos atrás.

“Comecei a frequentar as sessões de aconselhamento de saúde mental quando me senti cansada e muito triste. Senti que tinha um problema psicológico e isso me perturbava porque me sentia incapaz de lidar com outras pessoas. Perdi meu marido dois anos atrás e isso afetou a minha vida; mudou minha vida, revirou minha vida. Sou agora a única responsável pela criação dos meus filhos.”

Uma criança de dez anos descreve como o aconselhamento a ajudou a melhorar sua fala: “Comecei a frequentar as sessões para melhorar minha fala e me ajudar a superar meu medo. Tenho medo de tudo. Meu corpo está sempre tremendo. Não consigo mais falar as palavras corretamente. Meu professor e meus colegas de classe me batem o tempo todo na escola. Não consigo estudar ou aprender qualquer coisa. Não consigo me concentrar. Não falo com ninguém. Esta é a primeira vez que falo com alguém sobre meus problemas.”

Oferecer cuidados para experiências traumáticas não é fácil, mas o modelo de aconselhamento se provou benéfico para que as pessoas resgatem a dignidade e o controle sobre suas vidas.
 

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