França: em Calais, tratamento desumano aos exilados

Acampamento em que refugiados estão abrigados é coberto por lixo e um quarto dele está debaixo d’água

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Eles fugiram do Sudão, Síria, Afeganistão, Eritreia e agora estão vivendo em Calais, em um local conhecido como “a Selva”. Outros estão em Paris, em um colégio abandonado. Pauline Busson, coordenadora-geral da organização humanitária internacional Médicos Sem Fronteiras (MSF) na França, descreve as condições de vida desses exilados, na medida em que tentam encontrar um meio de chegar à Inglaterra ou buscar um futuro na França.    

Como é o local onde esses refugiados estão instalados em Calais?
O local ainda parece uma favela. Mas estão ocorrendo mudanças e as coisas estão se transformando rapidamente. O número de refugiados está aumentando regularmente. Hoje, há quase 6 mil deles, em comparação com os 2.500 que estavam ali em março, e estamos observando uma quantidade crescente de mulheres e crianças. Eles se estabeleceram ali de modo completamente aleatório e casual. O local não é adequado e carece de quaisquer comodidades. Não é à toa que é chamado de “a Selva”. Não houve nenhuma preparação, por exemplo, para fazer a gestão de resíduos – só foram levadas quatro grandes lixeiras ao local. O lixo se acumula por várias semanas, ficando apodrecido e empilhado pelo local. Mas, agora, há algum progresso. Uma equipe logística de MSF assumiu a grande tarefa de organizar a coleta de lixo. Uma picape de MSF para no acampamento todos os dias para coletar o lixo e distribuir sacos de lixo. Vinte toneladas de lixo são coletadas diariamente, com a ajuda de serviços municipais de gestão de resíduos que esvaziam as lixeiras.

Quais são as principais necessidades?
A higiene é um problema. É preciso muito mais banheiros e chuveiros. MSF estruturou 45 banheiros químicos, mas são necessários mais chuveiros. Isso significa ter de providenciar uma fonte de eletricidade para esquentar a água. Devem ser instaladas pias porque os lavatórios são muito baixos. As pessoas estão tendo de se arrastar em meio à lama, agachadas no chão para escovar seus dentes ou lavar suas roupas. Em termos de necessidades médicas, a clínica que a ONG Médicos do Mundo inaugurou – onde a equipe de MSF está trabalhando – está funcionando. São realizadas em média 80 consultas por dia. Dermatite e sarnas são comuns porque as condições de higiene são precárias e é difícil conseguir se lavar. Também vemos infecções do trato respiratório agora que o clima está ficando frio. Os refugiados também sofrem distensões, fraturas e ferimentos quando tentam entrar em caminhões ou pular dentro de trens que passam pelo túnel sob o Canal.  

Como a ajuda é organizada?
Nós, MSF, estamos presentes em Calais desde o início de setembro. E há uma infinidade de atores ali, tanto informais quanto profissionais. Foram criadas associações locais para responder à questão da migração. Uma distribui refeições. Associações de ajuda nacionais também foram para lá, junto a muitos voluntários – franceses, britânicos, anarquistas, hippies e ativistas – dos quais alguns estão vivendo no acampamento. Moradores de Calais também vão aos fins de semana para ajudar. Todos levam alimentos, vestuário e vários itens que são distribuídos de graça. Essas iniciativas representam um esforço para tornar a situação no acampamento mais suportável, enquanto as autoridades públicas abandonaram os exilados a sua própria sorte.

A situação é similar em Paris, em um colégio em desuso onde os exilados se abrigaram?
O cólegio Jean Quarré, que fica no 19º distrito de Paris, é um abrigo temporário, mantido pelo escritório do prefeito de Paris. É sujo, superlotado e tem instalações de água e saneamento precárias. Cerca de 800 pessoas – principalmente homens jovens do Sudão, Afeganistão, Eritreia, Somália, África do Norte e Ocidental – estão vivendo no local, também sob condições terríveis. Alguns não têm escolha a não ser estar lá, embora tenham obtido o estatuto de refugiado. Eles estão desesperados. Confrontado com essas condições desumanas, um homem sudanês de Darfur, que tem o estatuto de refugiado, me disse que estava pensando em voltar para o país onde é perseguido.

 

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