Atenção: a luta contra o Ebola ainda não terminou

Por Dra. Joanne Liu, presidente internacional de Médicos Sem Fronteiras (MSF)

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A corrida para conter a maior epidemia de Ebola da história tem sido uma maratona. Há um ano, eu cheguei à África Ocidental e vi o vírus devastando a região. Ele estava destruindo famílias e abatendo a estrutura da sociedade, enquanto autoridades nacionais e uma grande parte das organizações humanitária lutavam desesperadamente contra esse inimigo invisível e implacável.

De volta à Libéria, à Guiné e à Serra Leoa três meses depois, centenas de pessoas ainda estavam adoecendo toda semana. Não foi possível identificar como elas haviam sido infectadas, ou constatar com quem elas haviam estado em contato e, assim, possivelmente, se infectado. Mas o apoio internacional finalmente começava a chegar, enquanto as preparações para iniciar testes clínicos de tratamentos e vacinas experimentais estavam a caminho.

Na semana passada, eu voltei para a região, e estou aliviada de ver o quão longe chegamos. Embora ainda tenhamos alguns caminhos a percorrer, hoje, coletivamente, temos os meios para dar um fim à epidemia.

Durante meses, tem havido de 20 a 30 novos casos de Ebola toda semana. Na semana passada, havia apenas três. Novas cadeias de infecção estão sendo investigadas mais rapidamente e eficientemente, e podemos rastrear a propagação do vírus em comunidades. As autoridades nacionais estão demonstrando uma forte liderança e mantendo o ímpeto de acabar com o surto.

Embora todos nós almejemos um sinal de que o fim está à vista, a única previsão confiável nesta epidemia tem sido sua imprevisibilidade. Ela aumentou e diminuiu; muitas vezes, parecia ter sido extinta em uma região, mas uma pessoa doente que passou despercebida ou um enterro inseguro a fez reacender novamente.

Mas o mais encorajador até agora foram os resultados provisórios de um teste com uma vacina contra o Ebola na Guiné, publicados há 10 dias e muito promissores. Embora a vacina VSV por si só não dê um fim ao surto, nós esperamos que ela seja uma ferramenta adicional para finalmente ajudar a acabar com o vírus.

Apesar de nos sentirmos mais esperançosos do que nunca, estamos com medo de baixar a guarda mesmo que por um instante. A meta é chegar a zero pacientes durante 42 dias – o dobro do período de incubação do vírus – após o qual um país ou uma região pode ser declarado livre do Ebola.

Para cruzar esta linha de chegada, a perseverança – senão a pura teimosia – é necessária, com a continuação do rastreamento de cada pessoa que teve contato com um paciente de Ebola, para identificar e responder rapidamente a novos casos, e para assegurar que os enterros sejam realizados com segurança.

O elemento-chave final para o sucesso reside em ganhar a confiança da população local. Nossa equipe de promoção de saúde em Forécariah, Guiné, me contou como, desde que o Ebola ressurgiu novamente este verão, eles vão de casa em casa todos os dias para explicar a cada família como o vírus é transmitido, quais são os sintomas, o que fazer se alguém fica doente e como se cuidar com segurança.

As histórias que eles ouvem de alguns moradores dos vilarejos podem parecer surpreendente a essa altura da epidemia: o ceticismo quanto à existência do Ebola, os rumores de que a doença é transmitida por estrangeiros em trajes espaciais, ou que as pessoas podem ser curadas com medicina tradicional. Mas reservar um tempo para ouvir e responder a cada um foi comprovado que funciona.

A verdade é que o impacto do Ebola vai perdurar muito mais tempo do que poderíamos imaginar. Os sistemas de saúde da Guiné, da Libéria e de Serra Leoa, já fracos antes do surto, estão em farrapos. Centenas de agentes de saúde morreram tragicamente. Enquanto isso, sobreviventes de Ebola precisam de nosso apoio contínuo. Vencer o vírus foi, na realidade, seu primeiro obstáculo, seguido de complicações médicas que não compreendemos por completo ainda, tudo enquanto também precisam lidar com o estigma de suas comunidades.

Quatro de cada 10 pessoas em Serra Leoa conhecem alguém que morreu, esteve em quarentena ou sobreviveu ao vírus. Essas nações estão sofrendo, mas, ainda assim, continuam demonstrando coragem e determinação tremendas.

O Ebola pode estar longe das manchetes, mas ainda não terminou. Nós não sabemos o quão longe está a linha de chegada, mas sabemos como alcançá-la. Todos os envolvidos na resposta ao surto – tanto nacional como internacionalmente – precisam concentrar suas energias em manter o bom momento. E, ao acelerar o uso de novas vacinas nos países afetados, nós podemos ajudar a quebrar as cadeias de transmissão e a proteger os profissionais que atuam na linha de frente de combate ao Ebola.

Nossas equipes estavam lá desde o início. E, como corredores de longa distância que somos, vamos ficar até o fim.

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